01 abril, 2021

CRUZ, Bento da - O LOBO GUERRILHEIRO : romance.
Prémio Literário Diário de Notícias 1991 atribuído pelo júri constituído por Agustina Bessa-Luís; Diogo Pires Aurélio; Lídia Jorge; Vergílio Ferreira; Viale Moutinho
. Lisboa, Editorial Notícias, 1992. In-8.º (21 cm) de 338, [2] p. ; B.
1.ª edição.
Obra maior do autor, que além desta, conheceu outras duas edições (1980 e 2014).
"Entre amores desenfreados, intrigas familiares, contrabandistas e guerrilheiros, paisagens quase virgens e um minucioso enquadramento político-social, decorre a vida de André Lobo, nascido no Barroso e filho e lavradores. [...] Ao mesmo tempo que somos confrontados com a realidade barrosã, com os problemas da Guerra Civil de Espanha e seus reflexos, somos levados a mergulhar numa intensa paixão, que dá ao amor a característica de um estado de leveza."
(Excerto da sinopse, retirado da contracapa)
Sobre o autor, e o Lobo guerrilheiro em particular, com a devida vénia, transcrevemos o excerto de um texto da autoria de Francisco Duarte Mangas publicado no Correio do Porto, cujo link infra reproduzimos.
"Bento da Cruz é um escritor do seu tempo. Do nosso tempo. Parte substancial do tempo mais negro do século vinte português entra bruscamente na sua obra singular e perdurará nos tempos que hão-de vir. Porque, melhor do que ninguém, Bento da Cruz trata a memória como matéria perecível. E na memória há palavras privadas de afecto. Isto é: precisam de respirar na página, porque o nosso célere quotidiano padronizado as esquece - e palavra esquecida nem lugar lhe é destinado em língua morta.
"A obra literária do autor de O Lobo Guerrilheiro é, sem dúvida, um abrigo de alguns dos nossos mais genuínos vocábulos – que em lenta aluvião se dirigiam ao silêncio final – renascidos, devolvidos à comunidade falante, através de espantosas personagens que são outras das memórias levantadas do chão. O paciente ofício de limpar e enxugar a palavra – perdida nos matagais por pastores enamorados, contrabandistas esquivos ou outros transumantes em fuga que a roda do tempo amarfanhou – é uma das dádivas deste escritor ao nosso tempo, às gerações vindouras. À Língua Portuguesa.
O diálogo vivo, musical, depurado (dir-se-ia de guião cinematográfico) surge como outro dos contributos de Bento da Cruz para a Literatura portuguesa. É a fala mais genuína do povo, um povo concreto – marcado pela miséria, acossado por senhores terrenos e temente a Deus – que ao longo de séculos talhou a paisagem agreste. Um povo, no entanto, capaz de grandes gestos de humanidade mesmo em situações adversas. A solidariedade dos humildes é a mais sincera de todas."
(Fonte: https://www.correiodoporto.pt/obituario/bento-da-cruz-1925-2015)
"Lobo subia a rua devagar, curvado sob um peso invísivel. Porque de visível, apenas as botas cambadas com tombas novas, debaixo do braço esquerdo. Estava um dia bonito. Geara muito de noite, mas agora o sol incidia directamente sobre as pessoas e as casas, e a água fumegava nas represas.
Um dia bonito, sem dúvida. No entanto, Lobo não se sentia bem naquela manhã. Acordara cedo e mal dormido. Dir-se-ia que chamado pela voz dum anjo ou por qualquer outro misterioso aviso premonitório de desgraça iminente. Doença súbita? Atropelamento? Agressão?
Lobo subia a rua e meditava no caso. Saúde nunca lhe faltara, louvar ao Criador. Inimigos não tinha. A prova disso é que todos, passando, o cumprimentavam com simpatia. Atingira uma velhice tranquila e considerada. Não era pesado a ninguém, nenhum presumível herdeiro lhe desejava a morte.
À palavra «morte», estremeceu. Quantos anos lhe restariam de vida?"
(Excerto do Cap. I)
Bento Gonçalves da Cruz (1925-2015). "Nasceu na aldeia de Peireses, do concelho de Montalegre, em 22 de fevereiro de 1925. Num contacto direto com a vida do campo, viveu ali até aos 15 anos, altura em que ingressou na Escola Claustral de Singeverga, onde permaneceu durante 6 anos e se familiarizou com os grandes escritores da antiguidade, principalmente com os latinos.
Abandonou a vida claustral, mas prosseguiu os estudos, licenciando-se em Medicina pela Universidade de Coimbra. Regressou então ao município de Montalegre, onde montou consultório de clínica geral e estomatologia.
Em 1963 publicou o romance Planalto em Chamas, o primeiro de perto de duas dezenas de obras literárias enaltecidas pela crítica, algumas delas distinguidas com prémios literários nacionais de referência. Fundou em 1974 o jornal Correio do Planalto. Foi deputado à Assembleia da República. É patrono da Escola Secundária Bento da Cruz, em Montalegre.
Está representado em várias antologias e é hoje reconhecido como um dos mais destacados escritores portugueses contemporâneos."
(Fonte: wook)
Exemplar brochado em bom estado de conservação.
Muito invulgar na edição original.
20€

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