05 setembro, 2024

AGUILAR, António de -
AVENTURAS DE CAÇA
. [Prefácio de José Osório de Oliveira]. Lisboa, Parceria António Maria Pereira, 1935. In-8.º (20,5x14,5 cm) de 220, V, [3] p. ; B.
1.ª edição.
Interessante conjunto de narrativas sobre caça grossa, episódios vivenciados pelo autor nos meses de mato no interior de Benguela, Angola.
Obra premiada no Concurso de Literatura Colonial (1.ª categoria).
Inclui no final lista de termos/expressões de origem local: "Vocabulário em uso na região de Benguela e empregado neste livro".
"António de Aguilar não é um escritor de carreira. Emprego esta expressão para não dizer escritor profissional, espécie que quási não existe entre nós. [...]
É certo que a técnica não é, na literatura, a condição primordial, e a sua falta pode ser, mesmo, desculpável. Nas narrações de experiências vividas o interêsse do assunto faz esquecer, muitas vezes, a inexperiência literária. É o que costuma suceder com os livros dos homens de acção que contam a sua vida ou as suas aventuras. [...]
Por tudo isso, António de Agular tomas as proporções dum caso. Eis um homem de acção que escreve pela primeira vez um livro, que não tem a intenção de se dedicar à literatura, que conta apenas o que viveu e que, no entanto, compõe uma obra digna dum literato sabedor de tôdas as regras da arte. Trata-se, evidentemente, dum homem culto que se dedicou à acção e não dum homem formado por esta. Mas ainda assim admira como António de Aguilar soube compor um livro em que se narram tôdas as espécies de caçadas sem nunca repetir uma cena,  um episódio ou uma aventura. Ou foi duma felicidade única ou teve a inteligência rara de escolher.
Sob êsse aspecto, o livro de António de Aguilar chega a parecer o produto dum escritor de imaginação que quizesse mostrar tôdas as aventuras possíveis na África. A figura admirável do «Cátucinho», a figura curiosíssima de Bruaia, o caso extraordinário do Padre Luís dir-se-iam criações dum romancista. Nós sabemos, porém, que tudo nêste livro é verdade."
(Excerto do Prefácio)
"No sertão ràpidamente nos prende o viver indígena.
Breve se observa não ser o isolamento tamanho como seria dado prever ao escutar histórias que correm mundo e fazem fé.
O «telégrafo» negro põe-nos a par dos sucessos do mato e até das povoações europeias.
A floresta angolana parece morta mas, de facto, vive intensamente. A actividade quer de brancos quer de prêtos não foge ao exame do nativo mais rude, assim como não lhe passa a menor alteração na paz sertaneja.
Tudo serve ao gentio para matar o tempo.
O boi fugido do sambo; o sècúlo a tratos com os cipaios, o macaco roubador das lavras, o leão atravessando a selva, o muènéputo destrambelhado ou justiceiro, o funante desvacador de quimbos são motivos preciosos para infindas palestras.
Nas intermináveis noites de acampamento, aquecendo-me à fogueira, quantas vezes escutei tôda a narrativa, nos seus ínfimos pormenores, do viver dos europeus meus companheiros de sertão!
A miúde êste apurado espírito de observação crítica provoca e anima a perniciosa intrigalhada «cafuza», característica dominante da mentalidade europeia do interior.
Mas, acima de tudo, o que faz vibrar a alma do indígena é a narração das proezas de caça.
O caçador é homem lidando de perto com poderosos feitiços.
Por fôrça deles, consegue dominar o cazumbi maléfico protector ou mandante dos animais ferozes ao serviço de Gangas e Quimbandas.
Não pode, pois, deixar de ser um ente extraordinário.
E a admiração torna-se inexprimível se, por ventura, o caçador o é de elefantes.
O Jamba!
O monstruoso paquiderme, aos olhos do nativo representa tudo quanto há de mais poderoso debaixo do sol.
Homem matador de elefantes, seja êle por acaso, tem a reputação criada.
É célebre; não mais desaparecerá do folclore bàntú.
Por isso, não seria possível passar-me despercebido o nome de «Cátucinho», herói máximo das grandes aventuras de caça da região, abatedor de dezenas e dezenas de elefantes e búfalos, o branco feiticeiro ao qual a águia não escapava no vôo, nem o «grande boi de um chifre só» conseguia escuso recanto de muchito onde se abrigar da sua ira.
«Olho de Deus»... «Ah!... Pai... Pai... não há ninguém no mundo com semelhante pontaria...»
Numa tarde de 1918, conheci-o ao famoso caçador, futuro meu amigo e companheiro de cansadoras misérias, uma vez aproximados pelo destino para a conquista do pão. [...]
Alto, esgrouviado, um bigode pendente, vestia uma fatiota grosseira de roupa de fardo.
Os ombros estoiravam as costuras e, por isso, as mangas pouco mais desciam abaixo do cotovelo.
As calças afuniladas, paravam acima dos tornozelos, por sua vez fugidios de uns canos de bota de cabedal grosseiro, rugoso, e encebado até à dupla sola ferrada.
Mais que a vestimenta exótica e em contraste com o ar canhestro, prendeu-me a atenção o seu olhar vivo."
(Excerto do Cap.I)
Exemplar brochado em bom estado geral de conservação. Capas frágeis com defeitos, manchas, e pequenas falhas de papel.
Raro.
85€

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