19 abril, 2023

NEMÉSIO, Elias -
GENTE DA SERRA.
Ensaio, sôbre o casamento, emmoldurado em quadros rústicos. Faro, Tipografia "União", 1931. In-8.º (21,5 cm) de [16], 270, [2] p. ; il. ; E.
1.ª edição.
Romance-ensaio em que o autor - "serrano" algarvio - se propõe analisar o casamento sob o ponto de vista dos valores tradicionais, da moral e dos bons costumes. Raro e muito interessante.
Livro ilustrado com bonitas gravuras assinalando o início e final de cada um dos 17 capítulos.
O assunto, que me propús estudar, o matrimónio, interessa a quasi todos, sobretudo à gente nova. Que rapaz ou rapariga não terá perguntado anciosamente:
- Devo ou não devo casar?
Estudando êste assunto, ao-de-leve, não tive só em vista proporcionar leitura interessante, mas também dar conselhos aos novos, que pensam em mudar de estado e falam do casamento, com a cabeça um pouco no ar, com muita fantasia, através dum céu límpido de noivado...
A matéria é vasta, desde o namôro, a parte poética, até aos deveres dos cônjuges e à grande e tremenda responsabilidade da criação e educação dos filhos - fim último do casamento, segundo o conceito cristão. No estudo do matrimónio encontram-se questões muito delicadas. Devia fingir que as ignorava? Não está muito no meu feitio fingir. Além disso, por êsse Algarve fóra, nos combóios e nas camionetas, onde quer que concorram rapazes e homens de poucos escrúpulos e até mesmo em reuniões de amigos defendem-se, eu sei, práticas opostas aos princípios da moral e aos interêsses da colectividade. E mesmo entre as raparigas, as raparigas que chegaram à idade de casar - diga-se a verdade! - quantas são as que não conhecem, teoricamente as questões melindrosas do casamento?
Embora dos rapazes nenhum ignore o que vai encontrar nas páginas da Gente da serra (não sou tão pessimista como um velhote que me dizia: Estes negregados, os moços de agora, ainda não andam e já andam com malícia...) e das raparigas sejam raríssimas as que não o tenham aprendido em conversas com amigas mais velhas ou já casadas."
(Excerto de Carta-prólogo)
"Nem viv'alma passava pelas ruas ladeirentas e mal calcetadas da vila. O quarto crescente da lua desaparecêra já por detraz do Castelo. As lindas moiras encantadas, no dizer de pessoas antigas, pelas horas mortas da noite, saíam da cisterna e do corredor subterraneo que a ligava com a Fonte das Mentiras e, enquanto penteavam os seus lindos cabelos de agarenas, iam cantando a sua desdita, em melodias repassadas de tristeza e de saudade. [...] A noite ia envolvendo toda a vila no seu manto que aumentava a negregura á medida que a lua ia desaparecendo por detraz das muralhas velhissimas e torres esboroadas. Em todo o anfiteatro, tinham-se apagado as ultimas luzes. Apenas da janela do quarto de Júlio Fernandes, uma claridade mortiça, irradiando de um candieiro de azeite, saía a medo para o escuro da noite e espreitava os misterios daquele silêncio de necrópole. [...]
Sobre a ponte, com um pé fincado no parapeito e o cotovelo apoiado no joelho, José Costa, ou Zé Gordo, como era mais conhecido, olhava para o pégo, demoradamente. 
Adivinhava-se com facilidade que estava sofrendo nalma a amargura de quem se vê abandonado e, mais que abandonado, desprezado.
Quando o coração sangra, o fantasma da morte surge e, passando pelos olhos dos infelizes numa vertigem, procura seduzi-los, arrastá-los, prometendo-lhes alivio ao duro sofrer..."
(Excerto do Cap. I)
Manuel Francisco Pardal (Aljezur, 1896-1979). "Foi um religioso, professor e escritor português, sendo considerada a mais importante figura no concelho de Aljezur na época contemporânea. Ocupou altos cargos na Igreja Católica, chegando a ser nomeado Monsenhor pelo Papa João XXIII. Notabilizou-se como orador, tendo pregado em várias freguesias no sul do país, mas também em Lisboa, Fátima e Lourdes. Foi professor em Faro, no Seminário de São José, no Liceu Nacional, e na Escola Tomás Cabreira. Distinguiu-se igualmente como jornalista, tendo dirigido o periódico diocesano Folha de Domingo, onde escreveu durante cerca de meio século, e como escritor, tendo publicado três livros: Razões da minha razão, Menina das Águas Frias, e o romance Gente da Serra. Este último foi editado em Faro (1931), com o pseudónimo Elias Nemésio, e é um testemunho da vida quotidiana das populações no concelho de Aljezur no início do século XX, sendo considerada a sua obra principal."
(Fonte: Wikipédia)
Encadernação em percalina com ferros gravados a ouro na lombada. Conserva a capa de brochura anterior.
Exemplar em bom estado de conservação. Capa apresenta falha de papel no canto superior direito.
Raro.
Indisponível

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