26 dezembro, 2021

VIDOEIRA, Pedro - A FIDALGA DO JUNCAL (romance contemporaneo)
. Lisboa, Livraria Editora Viuva Tavares Cardoso, 1904. In-8.º (18,5 cm) de 463, [3] p. ; E.
1.ª edição.
Interessante romance de costumes cuja acção decorre no norte do país, sobretudo na cidade de Barcelos e arredores.
"Americanos pesados e alguns trens, vindos da Praça Nova e da Batalha, acabavam de largar na estação de Campanhã os passageiros que do Porto se destinavam á linha do Minho pelo comboio das dez e meia.
Estava-se no inverno - em principios de janeiro - e o dia que rompêra carregado e feio, desentranhava-se numa chuva persistente que não promettia parar. ás dez horas da manhã era tamanha a cerração que muitas lojas, como se a noite se avizinhasse, tratavam de accender o gaz para as voltas indispensaveis da sua labutação quotidiana.
A poucos passos de distancia, não se distinguiam os raros vultos que as suas occupações obrigavam a sahir de casa com tal dia.
Do largo da estação corriam para dentroda sala e entrada, abrindo os seus guarda-chuvas, as pessoas conduzidas pelos trens e americanos.
A sineta era o segundo toque de prevenção. Faltavam sómente cinco minutos para a partida do comboio.
Todos se encaminhavam em direccção ao guichet da bilheteira, enfiando pela grade de resguardo que serve de regulador ás impaciencias dos apressados. [...]
Mais adeante na cantina - o botequim dos pobres, onde os consumidores são menos exigentes em satisfações de paladar - pediam-se copos de genebra e aguardente, que saboreavam com estalinhos na bocca os passageiros de terceira classe, faceis de distinguir pelas suas grossas japonas de saragoça, pelos seus grossos tamancos de pau e pelos seus grossos cajados de marmeleiro. [...]
Os passageiros iam occupando os seus logares, acompanhados dos moços que lhes depunham nas redes os embrulhos, as coberturas, os saccos e as maletas. Os mais previdentes procuravam dr as costas á machina para vitarem no trajecto as lufadas de fumo que invadem os assentos da frente. [...]
A locomotiva - esse hippogrypho do progresso, cujo ventre insaciavel devora colossaes rações de hulha e cuja sêde só se extingue com formidaveis trombas de agua - resfolgava ruidosamente, vomitando espessas columnas de vapor. [...]
Guiado pela experiente direcção do machinista, o monstro começou emfim a mover-se, e a extensa fila de wagons, vagarosamente primeiro, depois com mais presteza, largou pela via fóra, deixando atrás de si um denso pennacho de fumo, que se esvaía pouco a pouco em successivas espiraes. [...]
- Barcellos! Barcellos!
Então abriu-se a portinhola de uma carruagem de primeira e desceu para a plataforma um passageiro de vinte e oito annos, typo moreno, olhar vivo, estatura regular e barba negra pouco espessa. [...]
Percorrida a curta distancia da Avenida que põe Barcellos em contacto com a estação, o nosso passageiro dava entrada no Hotel Central, situado ao fundo do Campo da Feira, e pedia ahi um quarto dos melhores.
Na mesma  noite da chegada daquelle desconhecido, já se sabia - como sempre succede nas terras de provincia - que elle tinha sahido do Porto, que se chamava Luiz Trigoso, que era bacharel em direito e que vinha alli tentar carreira pela profissão de advogado."
(Excerto do Cap I, O filho do lavrador)
Pedro Alcântara Vidoeira (1834-1917). Poeta, escritor e tradutor português, natural de Lisboa. Emprestou a sua colaboração a jornais e revistas da época, onde se destaca a conhecida publicação Branco e Negro : semanario illustrado. A BNP dá conta de extensa lista de obras traduzidas por Vidoeira, sobretudo de Júlio Verne. Refere também duas obras poéticas - Lyrica popular (1895) e Nova lyrica popular (1913) - e dois romances: A fidalga do Juncal (1904) e Ambições de cortezã (1914).
Encadernação em meia de percalina com ferros gravados a ouro na lombada. Sem capas de brochura.
Exemplar em bom estado geral de conservação. Cansado. Miolo correcto. Sem f. anterrosto.
Raro.
Indisponível

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