FREITAS, Fernando da Costa - D. FREI THYRSO DE GUIMARÃES. Novella minhota. [Novella vimaranense]. [Por]... Da Sociedade Martins Sarmento, de Guimarães, e do Instituto de Coimbra. Guimarães, Edição da Revista «Gil Vicente», 1925. In-8.º (22 cm) de 33, [3] p. ; B.
1.ª edição.
Novela histórica - aparentemente baseada em acontecimentos verídicos - cuja acção decorre no período das Guerras Liberais, que termina de forma misteriosa e não explicada, apesar do feliz desenlace.
Livro ilustrado com um desenho de D. Frei Thyrso - o D. Abade do Real Mosteiro de Santa Marinha da Costa - em página inteira, assinado D. Dantas.
Exemplar valorizado pela dedicatória manuscrita do autor ao "seu muito prezado Amigo e illustre conterraneo Dr. João Coelho da Motta Prego".
Pouco foi possível apurar acerca do autor, a não ser que era escritor, natural de Guimarães, mas a viver em Lisboa. Obra rara. A BNP não menciona.
"Pelos fins do seculo XVIII, começos do seculo XIX, havia ainda em Guimarães, na Rua do Valle de Donas, já então meio derruido, um palacio de architetura incaracteristica, - pesado, massiço, acachapado, uniforme -, notavel, tão só, por uma enorme pedra d'armas collocada a meio e ao alto da sua larga frontaria, - palacio que era o solar d'uma familia, nobre e rica, conhecida pelos Farias do Cidral.
Não constituia o segundo nome um appelido particular, ou exclusivo, d'esta familia, porque era antes uma alcunha que o povo lhe puzera, pela qual a conhecia, alcunha que o uso e o decorrer do tempo havia perpetuado, que passára já dos avós aos netos e d'estes aos filhos e tinha tido origem, como ella propria indicava, n'um vasto campo de cidras que havia junto da vetusta casa solarenga e era pertença d'esta, como aliás os campos, pomares e jardins - de boas e correntias aguas, de raras e deliciosas fructas e de lindas e mimosas flores -, que lhe ficavam em derredór.
Foi sem duvida d'essa alcunha e do campo que lhe deu origem, que proveio, mais tarde, o titulo de Conde do Cidral, com que um dos reis portuguezes quiz galardar, num dos membros d'essa linhagem, os valorosos feitos d'armas praticados, outr'ora, em terras da moirama, por alguns dos seus mais illustres antepassados, - feitos de que o seu brazão heraldico fallava com orgulho, nas vieiras d'azul que o cobriam em campo d'oiro, e no leão rompante que o timbrava.
Além de outras mercês e distincções com que os Farias do Cidral se pavoneavam, tinham eles, numa das suas propriedades situada nos suburbios de Guimarães, um privilegio cuja importancia é facil de calcular e que consistia em não poder ser preso pelo povo, nem por este ser entregue ás justiças do rei, nenhum malfeitor que, tendo conseguido entrar na referida propriedade, alli se conservasse com uma das mãos collocada, ou espalmada, sobre uma columna de pedra, d'um metro de altura, pouco mais.
Este privilegio, já ha muito extincto, como todos aquelles com que, em tempos idos, foi honrada e distinguida, em serie ininterrupta e nobillissima a terra natal do primeiro rei portuguez, honrando e distinguindo, consequentemente, cada um dos seus naturaes, constituia, como pode suppôr-se, um chamariz para toda a qualidade de malfeitores da velha cidade e seu termo - pelo menos.
Por ali passaram, - em transito, - ali se acoitaram durante horas, e até, alguns, durante dias, - á chuva, ao vento e ao frio, ou sob os rigores inclemente do sol -, criminosos de toda a especie, desde os simples desordeiros, aos salteadores de estrada; desde os reus de pequenos e insignificantes delictos, aos ladrões sacrilegos; desde os miseros larapios de fructa e criação, aos mais audazes e temiveis quadrilheiros; todos aquelles, emfim, tarde ou cedo, de saldal-as com a justiça, a não ser que conseguissem collocar-se, antes, sob a égide d'um bom patrono porque, então, este se encarregava de pôr pedra sobre o processo, favor que lhe colocava nas mãos a vida e fazendas do protegido e de que muitos usaram, - e abusaram -, em proveito proprio. [...]
Ora a narrativa que esta novella encerra, gira, precisamente, em torno d'um d'esses Farias do Cidral, descendente em linha recta, do nobre conde d'esse titulo, homem rude e voluntarioso, possuindo todos os defeitos mas nenhum das qualidades daquelles que, tendo herdado um nome illustre e uma fortuna consideravel, souberam manter o primeiro com dignidade e empregar a segunda com proveito.
Vão passadas muitas dezenas de annos sobre a sua figura antiphatica e se hoje, ao pretendermos vivifical-a aqui, ella não fica constituindo para nós outros, vimaranenses, nenhum motivo de orgulho, nem titulo de gloria, convem attentar que, em torno d'esse homem, outras personagens surgem egualmente do pó frio do Tempo e a seu lado se movem, formando estas um contraste flagrante com elle e sendo, por isso mesmo, um motivo de desvanecimento para os seus concidadãos ou conterraneos, - d'hontem, d'hoje e d'amanhã!"
(Excerto do Cap. I)
"Pero Thadeu Furtado Pereira de Souza Carvalho e Faria do Cidral ou, tão só, Pero Cidral, nomes pelos quaes era geralmente conhecido, tinha sido convidado por seu tio paterno o Dom Abbade do Real Mosteiro de Santa Marinha da Costa para saborearem juntos um delicioso saguate de trufas e ovo móles que o seu amigo D. Raymundo Braz, capitão de cavallos e corregedor da comarca d'Aveiro, - por sua Magestade Fidelissima -, lhe enviára, dias antes, como mimo de muita raridade e estimação.
Pero Cidral recebeu de sobrecenho carregado e má catadura; como era seu costume, o convite que lhe trouxera, de viva-voz, um dos numerosos creados do Mosteiro..."
(Excerto do Cap. II)
Exemplar brochado em bom estado de conservação. Capas frágeis, com vinco ao centro.
Raro.
Sem registo na Biblioteca Nacional.
Indisponível
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