09 janeiro, 2024

FOGAÇA, Braz - OS MARIALVAS. Reflexões de... Petintal d’Alfama. Lisboa, Lallemant Frères, Typ., 1876. In-8.º (19 cm) de 78, [2] p. ; B.
1.ª edição.
Curiosíssimo ensaio satírico e crítico dos costumes da época, tendo como pano de fundo a Lisboa boémia e viciosa, pródiga em "más práticas". O marialvismo e os marialvas: a borga, as touradas, o fado, as mulheres, o vinho… - o autor não poupa nada nem ninguém -, a burguesia endinheirada à cata de "brazão", a justiça, as autoridades, etc., todos concorrem para uma sociedade corrupta e corruptora.
"Marialva é o antilibertino português, privilegiado em nome da razão de Casa e Sangue, cuja configuração social e intelectual se define, nas suas tonalidades mais vincadas, no decorrer do século XVIII.
No convencionalismo popular (ou antes pequeno-burguês) marialva é o fidalgo (forma primitiva de «privilegiado») boémio e estoura-vergas. Socialmente será outra coisa: um individuo interessado em certo tipo de economia e em certa fisionomia política assente no irracionalismo. […] 
Em 1876, um folheto lisboeta (ed. Lallemant Frères, Typ.) utiliza a expressão pela primeira vez, conferindo-lhe um conteúdo sociológico: Os Marialvas, de Braz Fogaça, cronista citadino.
O libelo aponta a «essa meia dúzia de titulares que nós ainda para aí conservamos como relíquias da nossa velha fidalguia» e é uma descrição incendiária das aventuras miguelistas e dos menestréis de guitarrada que animavam a paisagem local sob o proteccionismo das castas."
(Pires, José Cardoso Pires, Cartilha do Marialva ou das negações libertinas, Lisboa, Ulisseia, 1960)
Publicado sob a capa de pseudónimo, sabe-se que o autor deste livrinho foi José Joaquim Gomes de Brito.
"Ha tres cousas em que eu creio sobre todas as outras.
Creio sobretudo nos Marialvas, no fôro e na policia. Sim. Creio na omnipotencia d’aquelles, apesar do que por ahi corre em sua deshonra; creio na equidade dos que administram justiça, apesar dos gritos de dôr e de desespero, dos choros e dos brados de indignação, que se levantam a todo o momento contra eles; creio na seriedade, zelo e inteireza da autoridade civil, apezar…
[…]
Na celebre Esparta eram os escravos que, por obrigação, representavam um vicio; - entre nós muda a cousa de figura: representam os nobres e dinheirosos os sete vicios capitaes, e são o verdadeiro symbolo da depravação.
Ah! Quem os fizesse passeiar em torno das multidões a esses nobres e dinheirosos dissolutos com as suas nojentas amantes! Cantariam, sem ser preciso ordenar-se-lhes, scholios mais obscenos que os dos ilotas embriagados; mostrariam sobre a própria pelle as eflorescencias do vicio; dansariam, não só o fandango e o lundú lascivo, mas ainda o fado imundo; entregar-se-hiam a todas as provocações da luxuria e da orgia!
Triste espectaculo, na verdade! Mas que serviço!
Além de se vingar a moral ultrajada, o pudor insultado, desmascarar-se-hiam os actores d’essas repugnantes saturnaes; e demonstrar-se-hia ao povo, que o imposto sobre o trabalho dos proletários engorda a ociosidade e retribue a libertinagem dos senhores, dos cavalheiros do high-life."
(Excerto do texto)
José Joaquim Gomes de Brito (1843-1923). "Escritor e arqueólogo, diplomado com o curso superior de Letras, e oficial da Câmara Municipal de Lisboa, nasceu em Lisboa em 1843 e morreu em 1923. Foi sócio fundador da Sociedade de Geografia de Lisboa e sócio honorário da extinta Associação Industrial Portuguesa. É vasta a sua bibliografia, composta sobretudo de artigos publicados em vários jornais da capital, a partir de 1876.”
Exemplar brochado em bom estado geral de conservação. Cansado. Capas e lombada com defeitos e pequenas falhas.
Muito invulgar.
20€

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