12 fevereiro, 2020

ABREU, Solano de - MALTRAPILHOS. Lisboa, Parceria Antonio Maria Pereira : Livraria, 1918. In-8.º (19,5 cm) de 261, [3] p. ; E.
1.ª edição.
Romance naturalista de ambiência rural, dedicado pelo autor a Teixeira de Queiroz. História de um moço de dezassseis anos, conhecido por "Corvaxo", nascido "na Cova da Onça, num barracão de malteses, annexo á taberna da Josefa Zanaga".
"A feira formigava de gente alastrada em manchas largas, variegadas, na vasta explanada onde os gados se expunham e os arruamentos branquejavam em renques de lona. Nas barracas das farturas a massa esguichava de seringas de lata, ficando a nadar no azeite fumegante em crepitações de fervura. Doutras vinham cheiros engulhosos do fartum das caldeiradas e cantigas lamuriantes ao som de guitarras, que gemiam fados no mesmo queixume. Seguiam-se as dos sapatos, tresandando a sola fresca, moldada em formas de grosseiros feitios e o rasto cravejado de grossa pregaria, porque as não havia finas, sem resistencia para o contacto com a terra pedregosa na lida do trabalho, ou na aspereza da caminhada. [...]
Os ciganos tisnados, olhos vivos de avelludada negrura, no meio das mulheres de saias garridas, numerosas, ou em farta roda, os lenços largos de ramagens berrantes, os cabêlos cahidos em caracoes azeitados, barafustavam, berravam em côro, no encarecimento das nobres qualidades do gado para a troquilha, tentadora dos freguezes inexperientes.
E então o burro avelhado, farto de trabalho e fome, as orelhas pendentes, o beiço cahido, tinha de trotar ligeiro á custa do aguilhão, cruelmente aguçado, solidamente cravado no anel do cigano, voltado para a palma da mão, prompto a espetar-se na anca da victima, com a simulação traiçoeira duma bondosa caricia ou dum innocente estimulo. E, se a troca estava por pouco, a cigana, em altos gritos, lamentava-se, accusando o marido de desgraçar a familia com desastrosos negocios, para mais tentar, para melhor illudir o outro, que se convencia com o astucioso protesto, com a enganosa lamuria.
Mais lá, onde o pó se erguia em nuvem densa, volteavam os pares na dança e as raparigas iam nos braços delles agarradas como novilhas em pegas de ferra. Pairava por toda a feira a poeira nevoenta, que o sol pulverisava em vibrações de oiro."
(Excerto do Cap. I)
Francisco Eduardo Solano de Abreu (1858-1941). "Nasceu a 19 de Julho de 1858 em Abrantes, tendo-se formado em Direito pela Universidade de Coimbra em 1885. Embora tenha exercido advocacia e a magistratura, foi noutras áreas que se tornou conhecido na sociedade abrantina, nomeadamente como empresário agrícola e sobretudo na área de assistência social, onde a sua filantropia o tornou estimado de muita gente a quem ajudou a minorar múltiplas carências socio-económicas. A título de exemplo refira-se a fundação em 1921 da Sopa dos Pobres ligada ao Montepio Abrantino a cujos corpos sociais pertenceu. Pelas suas atividades humanitárias recebeu o grau de Comendador da Ordem de Benemerência e a medalha de Mérito, Filantropia e Generosidade.
Homem de cultura e amante das atividades cénicas, foi diretor do jornal "Correio de Abrantes e escreveu romances e peças de teatro, como a revista "No País da Aletria" que foi representada no desaparecido Teatro Ator Taborda. Solano de Abreu faleceu em 1941."
(Fonte: ae1abrantes.esdrsolanoabreu.pt)
Encadernação editorial inteira de percalina com ferros gravados a seco e a ouro na pasta frontal e na lombada.
Exemplar em bom estado de conservação.
Raro.

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