03 março, 2021

BASTOS, José Joaquim Rodrigues de - O MEDICO DO DESERTO.
Pelo Conselheiro...
Porto: Na Typographia de Sebastião José Pereira, 1857. In-8.º (21 cm) de [6], 231, [1] p. ; E.
1.ª edição.
Interessante romance introspectivo, redigido na primeira pessoa, que narra a vida de um médico egípcio que, após formar-se em Paris, retorna a casa com a reputação abalada pelo boato de tentativa de envenenamento de sua mulher. Após a morte desta, que o acompanhou no regresso, o desgosto e o remorso impelem-no ao deserto, onde vagueia, até ser recolhido meio-morto por uma tribo de beduínos, iniciando aí a sua "segunda vida".
A BNP não possui no seu acervo esta edição (a original); apenas a 2.ª edição - publicada no mesmo ano que a primeira (1857) -, e a 3.ª edição (1864). História invulgar, bem construída e e muito curiosa.
"A historia deve ser verdadeira, ainda que seja inverosimil; o romance deve ser verosimil, ainda que não verdadeiro. Ambas estas coisas são difficeis, principalmente para um octogenario como eu, que não tem a força de olhos necessaria para vêr e explorar, nem a riqueza de imaginação precisa para inventar e descrever.
Qual é mais util? O historiador talvez dirá que a historia, o romancista que o romance; e eu sem me abalançar a decidir, direi apenas que exprimio um grande pensamento o philosopho que disse, que a historia é o romance do espirito humano, e que o romance é a historia do coração."
(Excerto do Prefacio)
"Meu pae era Francez. O encarregada da sua educação quiz que ella nem fosse meramente liberal, nem meramente mecanica, para que, se uma não fizesse a sua felicidade, podesse a outra fazêl-a.
Nós nascemos para trabalhar, dizia elle, como as aves para voar: mas quantos ha que querem trabalhar, e não acham em que? Quantos Advogados não teem clientes? Quantos Medicos não teem enfermos? Quantos, habilitados para os cargos publicos, são subplantados pela ignorancia e pela intriga? Um officio é, em taes circumstancias, um grande recurso. [...] Meu pae, assim educado, nem se deu á profissão das letras, nem á das artes; e, levado do enthusiasmo do tempo, se alistou voluntariamente na das armas, fez a guerra de Italia, e acompanhou Buonaparte em sua expedição ao Egypto.
Ahi foi ferido em diversos combates; e, arrependido de haver entrado n'uma carreira, que já lhe não parecia ser aquella para que se alistára. [...]
Feita a capitulação, e concluido o embarque do exercito, sentio-se repassado de uma grande saudade, vendo-se separado, e talvez para sempre, de seus antigos companheiros de gloria, nos trabalhos e nos perigos.
Dado este passo, era necessario dar outro, o de prover á sua subsistencia: o que se lhe não figurava difficil, nem o era com effeito.
Havia em Alexandria um estatuario insigne, cujos officiaes preparavam as obras, até o estado de receberem os ultimos traços, que elle para si reservava; e com os quaes parecia dar-lhes vida, e fazêl-as respirar. [...]
O estatuario tinha uma filha de uma belleza rara. Meu ape, tendo-a visto uma vez, atravez do veo que a cobria, concebeu logo por ella uma d'essas paixões, que captivam, que fazem enlouquecer, e que se não sabem explicar.
Sem esperança de a conseguir, e apenas de a tornar a vêr, foi offerecer-se ao estatuario, para trabalhar na sua officina."
(Excerto do Cap. I)
José Joaquim Rodrigues de Bastos (1777-1862). "Nasceu a 8 de Novembro de 1777 em Moutedo, Valongo do Vouga, e veio a falecer no Porto a 4 de Outubro de 1862.
Matriculou-se em Direito na Universidade de Coimbra e formou-se em 1804, passando a exercer a advocacia no Porto. A partir de 1812 envereda pela magistratura ao ser nomeado Juiz de Fora em Eixo e vilas de Paus, Óis da Ribeira e Vilarinho do Bairro. Em 21 de Novembro de 1823 é nomeado Corregedor e Provedor da Comarca do Porto e, no ano seguinte, a 9 de Abril de 1824, é ordenado Cavaleiro da Ordem de Cristo. De 22 de Junho de 1825 a 16 de Agosto de 1826, exerce as funções de Desembargador da Relação e Casa do Porto, posto o que foi Intendente Geral da Policia da Corte e do Reino, em 1827, e tomou o título de Conselheiro. A 25 de Outubro de 1826 a Infanta regente, D. Isabel Maria, nomeia-o Fidalgo da Casa Real.
Politicamente, milita nas fileiras do Partido Liberal Conservador, sendo eleito deputado pela Província do Minho em Dezembro de 1820, e tendo participado nas primeiras Assembleias Gerais Legislativas portuguesas. Em 1833 abandonou em definitivo a vida política e passou a dedicar-se, exclusivamente, à literatura e a estudos religiosos.
Obras publicadas: “Colecção de Pensamentos, Máximas e Provérbios” (1847); “Meditações ou Discursos Religiosos” (1842);  “A Virgem da Polónia” (1849); ”Os dois artistas ou Albano e Virginia” (1853); ”O Médico do deserto” (1857); “Biografia da Sereníssima Senhora Infanta D. Isabel Maria”."
(Fonte: http://agueda.bibliopolis.info/Catalogo/Autores-Locais/ModuleID/1497/ItemID/1068/mctl/EventDetails)
Encadernação em meia de pele com ferros gravados a ouro na lombada. Sem capas de brochura.
Exemplar em bom estado geral de conservação. Sólido. Pastas cansadas, com acentuado desgaste nas margens e nos cantos. Sinais de humidade.
Raro.
35€

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