PIA, M., e GARDANNE, M. - AVISOS // INTERESSANTES // SOBRE AS MORTES APPARENTES: // RECOPILADOS DA COLLECÇAÕ // DA // SOCIEDADE HUMANA // DE INGLATERRA, // DAS OBRAS // DE // M. PIA, E M. GARDANNE. // LISBOA // Na Offic. da Acad. Real das Sciencias. // Anno M. DCC. XC. // Com licença da Real Meza da Comissaõp Ge- // ral sobre o Exame, e Censura do Livros. In-8.º (15,5 cm) de 30, [2] p. ; E.
1.ª edição.
Interessantíssimo tratado setecentista sobre a morte aparente, e as formas de distinguir esta da morte real, questão momentosa, que afligia as pessoas nesse tempo.
Raro e muito curioso. Constitui, por ventura, o primeiro manual de primeiros socorros escrito em língua portuguesa.
Obra dividida em duas partes, reportando à morte por asfixia - pela água e por inalação -, por certo, as "mortes aparentes" com maior incidência na época.
Sobre este assunto, e sobre esta obra em particular, com a devida vénia, reproduzimos parte de um artigo de Rafael Campos inserto em História e Ciência - Ciência e Poder na primeira Idade Global.
"Na viragem do século XVIII para o XIX, os avisos foram obras bastante específicas e dedicadas à instrução pública da saúde, motivadas principalmente pela ideia de que o saber (popular) empregado nos campos era nefasto para a saúde dos povos. [...]
Os avisos eram obras de escrita simples, condizente com os ideais de popularização perpetrados pela Ilustração e também com a referida ideia de que a medicina feita nos campos era atrasada e pouco “científica”, posto que praticada quase exclusivamente por iletrados e curandeiros. [...]
No contexto do Império português, diversos avisos foram publicados ou traduzidos, sendo que a participação de portugueses da América não foi menor nesta empreitada. Mesmo após o Avis de Tissot (1761), não foi publicada em Portugal nenhuma obra especificamente alistada com o tema, apenas passados 25 anos outro aviso veio a lume. Um texto que era na verdade a tradução do Avis de Tissot, realizada por Manuel Joaquim Henriques de Paiva. [...]
Mas no mesmo ano em que publicava os dois volume da sua tradução do aviso de Tissot, Henriques de Paiva redigiu um aviso. Dos seus primeiros textos deste gênero, que “avisava” sobre questões singulares que inquietavam toda a gente, este tratava das então ditas mortes aparentes, que compreendiam um rol de doenças e eventos pouco conhecidos e para aquela altura de difícil identificação. Henriques de Paiva dedicou especial atenção sobre os meios de se realizar os socorros e distinção dos diferentes tipos de asfixia, pois segundo ele o “[…] estado dos sujeitos nas diferentes asfixias é em geral quase sempre o mesmo […] está a respiração suspendida por falta de ar livre e puro”. [...]
A partir de então, diversos outros avisos chegaram ao conhecimento público em solo luso. O primeiro destes foi uma tradução de Francisco Manoel de Oliveira de textos publicados na Human Society que igualmente versavam sobre as mortes aparentes. Neste Avisos interessantes à humanidade, a maior atenção estava mesmo depositada na temerosa ideia de que uma pessoa poderia ser considerada morta, por diversas razões, e então sepultada viva. Assim, pretendia-se “acautelar o género humano contra as enganosas aparências da morte”. Do ponto de vista formal, este aviso difere dos demais, pois continha diversas cartas e até mesmo um sermão, que relatara, dentre referências bíblicas da ressurreição de Cristo, um caso de um “morto trazido à vida”, ou nos termos de então de uma “restauração de qualquer vida”. Ainda sobre esta temática das mortes aparentes, foi publicado pela Academia das Ciências de Lisboa um aviso compilado da Human Society dos textos de Joseph-Jacques de Gardanne e Philippe Nicolas Pia. Mas este aviso é na verdade uma versão particular do documento referido acima, com uma linguagem ainda mais simples e clara, e sem trazer as cartas e os sermões publicados no aviso que ficou sob os cuidados de Carlos Murray."
(Fonte: CAMPOS, Rafael Dias da Silva, Saúde e poder em Portugal na virada dos séculos XVIII e XIX, o caso dos Avisos ao público in História e Ciência - Ciência e Poder na primeira Idade Global, FLUP, 2016)
Os avisos eram obras de escrita simples, condizente com os ideais de popularização perpetrados pela Ilustração e também com a referida ideia de que a medicina feita nos campos era atrasada e pouco “científica”, posto que praticada quase exclusivamente por iletrados e curandeiros. [...]
No contexto do Império português, diversos avisos foram publicados ou traduzidos, sendo que a participação de portugueses da América não foi menor nesta empreitada. Mesmo após o Avis de Tissot (1761), não foi publicada em Portugal nenhuma obra especificamente alistada com o tema, apenas passados 25 anos outro aviso veio a lume. Um texto que era na verdade a tradução do Avis de Tissot, realizada por Manuel Joaquim Henriques de Paiva. [...]
Mas no mesmo ano em que publicava os dois volume da sua tradução do aviso de Tissot, Henriques de Paiva redigiu um aviso. Dos seus primeiros textos deste gênero, que “avisava” sobre questões singulares que inquietavam toda a gente, este tratava das então ditas mortes aparentes, que compreendiam um rol de doenças e eventos pouco conhecidos e para aquela altura de difícil identificação. Henriques de Paiva dedicou especial atenção sobre os meios de se realizar os socorros e distinção dos diferentes tipos de asfixia, pois segundo ele o “[…] estado dos sujeitos nas diferentes asfixias é em geral quase sempre o mesmo […] está a respiração suspendida por falta de ar livre e puro”. [...]
A partir de então, diversos outros avisos chegaram ao conhecimento público em solo luso. O primeiro destes foi uma tradução de Francisco Manoel de Oliveira de textos publicados na Human Society que igualmente versavam sobre as mortes aparentes. Neste Avisos interessantes à humanidade, a maior atenção estava mesmo depositada na temerosa ideia de que uma pessoa poderia ser considerada morta, por diversas razões, e então sepultada viva. Assim, pretendia-se “acautelar o género humano contra as enganosas aparências da morte”. Do ponto de vista formal, este aviso difere dos demais, pois continha diversas cartas e até mesmo um sermão, que relatara, dentre referências bíblicas da ressurreição de Cristo, um caso de um “morto trazido à vida”, ou nos termos de então de uma “restauração de qualquer vida”. Ainda sobre esta temática das mortes aparentes, foi publicado pela Academia das Ciências de Lisboa um aviso compilado da Human Society dos textos de Joseph-Jacques de Gardanne e Philippe Nicolas Pia. Mas este aviso é na verdade uma versão particular do documento referido acima, com uma linguagem ainda mais simples e clara, e sem trazer as cartas e os sermões publicados no aviso que ficou sob os cuidados de Carlos Murray."
(Fonte: CAMPOS, Rafael Dias da Silva, Saúde e poder em Portugal na virada dos séculos XVIII e XIX, o caso dos Avisos ao público in História e Ciência - Ciência e Poder na primeira Idade Global, FLUP, 2016)
"He indubitavel que em muitos exemplos de apparentes mortes repentinas, e ainda mesmo em certas enfermidades, que segundo as apparencias destroem o genero humano, póde ter ligar huma suspensaõ das potencias vitaes, independentemente da absoluta extincçaõ da vida, e presentemente he maxima estabelecida, que o frio do corpo, a insensibilidade dos membros, e a falta dos sentidos externos, saõ huns finaes de morte muito duvidosos, e enganadores. Para acautelar contra estas apparencias de morte, brevemente se fará mençaõ daquelles cazos, em que com frequencia contumaõ succeder, e dos meios conhecidos de os prevenir, e remediar."
(Prefacio)
"Logo que hum affogado he tirado da agoa, o primeiro cuidado he despillo, e alimpallo immediatamente com hum pano, para lhe enxugar toda a superficie do corpo, e cabeça: cobrir lhe a cabeça com hum barrete de lã; e o corpo com a camiza de baeta, ou com hum capote, ou cobertor de lã.
Sendo necessario conduzir o corpo para algum lugar mais conveniente, haja muito cuidado em o naõ molestar, nem pegar-lhe com violencia, ou conduzillo aos hombros com a cabeça pendente para baixo, e muito menos rolando-o pelo chaõ, ou sobre barril, nem levantallo pelos pés, com pretexto de lhe fazer lançar a agoa. Pois a experiencia tem mostrado que estes methodos saõ prejudiciaes, e destroem os pequenos restos de vida que o doente ainda tem."
(Excerto do Cap. I - Do modo de administrar aos Affogados os socorros necessarios para os restabelecer)
"As asfyxias, impropriamente chamadas suffocaçaõ, causadas pelo vapor do carvaõ acceso, cujo uso he diariamente indispensavel, e em algumas artes como a de Cerieiro, Dourador &c., se podem prevenir, tendo sobre o brazeiro hum vazo de abertura larga cheia de agoa, com huma pequena quantidade de vinagre. [...]
Tendo succedido ter alguma pessoa suffocada; os que forem acodir he necessario que o façaõ com cautela, para naõ succeder o cahirem tambem suffocados. As cautelas he naõ entrar na casa sem ter feito abrir todas as portas, e janellas: e deitar bastante agoa pela casa, que he o verdadeiro especifico para distrahir a atmosfera a mosseta que causa o vapor do carvaõ acceso. Sem isto seria melhor, fazer uso de hum gancho para arrastar o doente para fóra, do que expôr-se a hum perigo evidente."
(Excerto do Cap. II - Do modo de remediar nas asfyxias causadas pelo vapor do carvaõ, ou outros mefytismos)
Matérias:
I - Do modo de administrar aos Affogados os socorros necessarios para os restabelecer; Recapitulaçaõ. Aviso Particular: Para os Arraes, e Companhias das Embarcações; Aviso Particular: Ás pessoas encarregadas da Caixa.
II - Do modo de remediar nas asfyxias causadas pelo vapor do carvaõ, ou outros mefytismos.
Encadernação recente, cartonada, com ferros gravados a seco e a ouro na pasta anterior.
Exemplar em bom estado de conservação.
Raro.
Peça de colecção.
85€
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