21 novembro, 2024

CONDE DE RIO MAIOR, Antonio -
UMA OPINIÃO SOBRE OS EXPOSTOS DA SANTA CASA DA MISERICORDIA DE LISBOA. Pelo...
Lisboa, Imprensa Nacional, 1866. In-8.º (22,5x13,5 cm) de [2], 173, [7] p. ; il. ; E.
1.ª edição.
Importante contributo para a história dos enjeitados em Portugal. Trata-se do relatório sobre os expostos da SCML, publicado pouco tempo antes das profundas transformações operadas pela novel política de recolhimento de crianças abandonadas, a partir de 1870, motivada por questões financeiras.
Ilustrado com quadros e tabelas estatísticas no texto.
Raro. Com interesse histórico.
"Nomeado pelo governo adjunto do provedor da Santa Casa da Misericordia de Lisboa, fui obrigado, pouco tempo depois de ter tomado posse do logar, a sair do reino por motivos de saude. Entendi que devia aproveitar a occasião para visitar alguns estabelecimentos de caridade no estrangeiro, e procurar documentos, que instruindo-me principalmente na questão dos expostos, um dos problemas mais graves que a mesa da Santa Casa deseja resolver, me ajudassem a formar uma opinião sobre esta difficil e importante materia.
São estes estudos que venho publicar hoje...[...]
A ordem que seguirei no exame das m,aterias é a seguinte:
1.º Tratarei das rodas, procurando provar que, no estado em que nos achâmos, a sua supressão imediata é impossivel.
2.º Emquanto aos socorros ás mães, distinguirei as casadas das solteiras, e para umas e outras a conveniencia ou inconveiencia d'estes mesmos socorros, a creação de premos, a organisação de associações religiosas, finalmente a necessidade da fiel execução de boas leis contra a exposição.
3.º Fallarei da inspecção e das amas, distinguindo dois periodos da vida do exposto.
4.º Finalmente direi o que entendo a respeito do hospital dos expostos na Santa Casa de Lisboa, e as reformas que julgo poderem ali introduzir-se."
(Excerto da Introducção)
António José Luís de Saldanha Oliveira Juzarte Figueira e Sousa, 1.º marquês de Rio Maior (1836 - 1891). "Era filho dos 3.ºs Condes de Rio Maior, João Maria de Saldanha Oliveira Juzarte Figueira e Sousa Mãe e Isabel Maria José de Sousa Botelho Mourão e Vasconcelos, foi o 4.º Conde e 1.º Marquês de Rio Maior. Foi bacharel em Direito pela Universidade de Coimbra, oficial-maior da Casa Real com o cargo de mestre-sala, Par do Reino e deputado. Foi adido honorário da Legação em Paris, provedor da Santa Casa da Misericórdia em Lisboa, presidente da Câmara Municipal de Lisboa."
(Fonte: https://monarquiaportuguesa.blogs.sapo.pt/antonio-jose-de-saldanha-oliveira-e-970381)
Bonita encadernação meia de pele com rótulo e ferros gravados a ouro na lombada. Sem capas de brochura.
Exemplar em bom estado de conservação.
Ostenta ex-libris dos Viscondes de Santarem e de Villa Nova da Rainha no verso da pasta anterior e na folha que precede o ante-rosto.
Raro.
85€

20 novembro, 2024

CLARO, Rogério -
O DRAMA DE BOCAGE.
Conferência proferida no Salão Nobre dos Paços do Concelho de Setúbal, em 15 de Setembro de 1948. Setúbal, [s.n. - Execução gráfica da Escola Tipográfica do Orfanato Municipal de Setúbal - 1949], 1949. In-4.º (25x19 cm) de 28, [4] p. ; [1] f. il. ; B.
1.ª edição.
Homenagem do autor a Bocage, o "poeta do Sado".
Bonita edição, impressa em papel de superior qualidade, ilustrada extra-texto com o retrato do vate setubalense.
"Na forma do ano passado, comemoramos hoje, com funda alegria, o nascimento, em Setúbal, de um dos seus filhos mais ilustres que foi também um das figuras mais destacadas das páginas literárias da Nação Portuguesa.
Este festa tem, simultâneamente, dois objectivos: o primeiro, prestar homenagem a quem foi, pelo seu génio, um grande e alto valor nacional; o segundo, unir espiritualmente em alto pensamento todos os que aqui nasceram ou aqui criaram fundas razão de amor."
(Excerto da alocução do Dr. Miguel Rodrigues Bastos, Presidente da CMS)
"Ao ler atentamente toda a obra poética de Bocage, uma pergunta imediata se formulou no meu espírito: Até que ponto foi a vida do poeta um aturdimento à angústia que o sufocava?
Poderá parecer estranho falar-se de angústia num homem que viveu tantas aventuras libertinas e que tantas vezes tem sido apresentado como um chalaceador optimista e brincalhão.
Mas o facto não pode ser negado, tal a evidência com que se nos apresenta: Bocage viveu um intenso drama e, se na literatura ocupa um lugar de acentuado relevo pela forma como soube exprimir os sentimentos vários que o agitavam, no campo da especulação filosófica a sua figura aparece-nos cheia de elevação moral."
(Excerto da Conferência)
Exemplar em brochura, bem conservado.
Muito invulgar.
Com interesse histórico e biográfico.
15€

19 novembro, 2024

SUBTIL, Manuel -
AURAS : versos.
Prefacio de J. A. Caldeira Rebollo. Portalegre, Typographia Fragoso & Leonardo, 1898. In-8.º (21,5 cm) de VIII, 74, [2] p. ; B.
1.ª edição.
Edição original daquela que será a primeira obra do autor, não referenciada na Biblioteca Nacional, recolha poética da sua mocidade.
"Em 1891, n'uma manhã d'Outubro, entrou em minha casa, na rua da Rosa, o moço poeta, que agora me entala n'estas paginas. Quem me havia de dizer?
Acompanhava-o seu pae, o sr. José Joaquim Subtil, um portuguez de lei, de rosto aberto e franco emôldurado n'umas pequenas suissas, a que vulgarmente chamam patarras, no Alentejo. Cultiva umas pequenas geiras de terra em Valle do Pezo e vinha trazer o rapaz, dizia, para frequentar a Escola Normal. [...]
Em meados de 1894 frequentava o meu pupilo o 3.º e ultimo anno do seu curso; appareceu-me na repartição do Ministerio do Reino, onde eu, como tantos outros ganho o pão quotidiano atrophiando o espirito com a rotina dos officios de chapa, e afferrolhando todos os ideiaes, na negrura estupida da manga d'alpaca. Pareceu-me mais timido do que d'outras vezes.
- O que traz aqui Manuel?
O Manuel saccou acanhadamente de um quarto de papel, cuidadosamente dobrado, e respondeu-me com o olhar velado de quem pede coisa assaz difficil.
- Trazia-lhe isto para o senhor publicar n'O Leão...
O isto que elle me trazia era a Pescadora, uma das mais bellas manifestações poeticas do seu estro brilhante, que o leitor vae admirar em seguida, tanto mais se tiver o cuidado de lembrar-se de que foi escripta dos 18 para os 19 annos por um alumno da Escola Normal. [...]
Um dia, já terminado o curso, e quando elle leccionava no Collegio Collipolense, aconselhei-o a junctar em livro todas as suas poesias... [...]
Do meu conselho nasceu o presente livro, um livro sadio e bom, que nos ensina a amar tudo quanto ha de nobre no coração humano, tudo quanto ha de bello na Natureza sempre fecundante, num livro singelo e perfumado como são perfumadas e singelas as flores da paysagem, que elle nos canta com hymnos melodiosos de formosissimo sentimento artistico."
(Excerto de Prefacio)

"Vem commigo, pescadora,
deixa o rude labutar,
larga o barco, deixa o mar,
solta a rêde e vem-te embora,
deixa o rude labutar,
vem commigo, pescadora.

Vem-te embora, faz-me medo
o rugido cavernoso
que o mar solta furioso
la nos antros do rochedo;
o rugido cavernoso,
que o mar solta, faz-me medo.

Nuvens colossaes, diversas,
quaes gigantes desconformes,
ora se cruzam disformes,
ora apparecem dispersas,
quaes gigantes desconformes,
nuvens collossaes, diversas...

Vem commigo, pescadora,
deixa o rude labutar,
larga o barco, deixa o mar,
solta a rêde e vem-te embora,
deixa o rude labutar,
eu amo-te, ó pescadora."

(Excerto de Pescadora)

Manuel Subtil (1875-1960). "Professor e Educador, nasceu na Freguesia de Vale do Peso (Crato), a 05-02-1875, e faleceu em Lisboa, a 15-04-1960. Diplomado pela Escola Normal de Lisboa, Manuel Subtil, frequentou, posteriormente, o Instituto Industrial e Comercial. Foi professor primário, exerceu funções em Loures, Arronches e Lisboa. Em 1902, participou como Subinspector no processo de criação de várias Escolas no círculo de Portalegre. A partir de 1913, leccionou, como Professor interino, na Escola Normal de Lisboa. Também desempenhou funções lectivas no ensino particular, nomeadamente nas Escolas Nacional e Académica. Entre 1925 e 1944, integrou o corpo docente do Instituto de Orientação Profissional, na sequência de um convite de Faria de Vasconcelos. No biénio de 1926-1928, foi membro do Conselho Administrativo da Universidade Popular de Lisboa. Fez parte de várias comissões de serviço ligadas à organização e administração do ensino primário. Publicou, em conjunto com Cruz Filipe, Faria Artur e Gil Mendonça, um Dicionário Escolar, Cadernos de Exercícios e Manuais Escolares de Leitura e Aritmética para as várias classes do Ensino Primário, que atingiram várias dezenas de edições. Assinou, com Faria de Vasconcelos e Fernando da Costa Cabral, diversas monografias profissionais."
(Fonte: https://ruascomhistoria.wordpress.com/2019/06/19/quem-foi-quem-na-toponimia-do-municipio-do-crato/)
Exemplar brochado em razoável estado de conservação. Capas frágeis com defeitos, rasgões e pequenas falhas de papel. Lombada apresenta tosco restauro com fita gomada. Pelo interesse e raridade justifica encadernar.
Raro.
Sem registo na BNP.
25€
Reservado

18 novembro, 2024

ALVES, Padre Gonçalo -
O FIM DOS TEMPOS OU O FIM PROXIMO DO MUNDO.
A Segunda Vinda de Christo, ás Portas. Porto, Imprensa Nacional de Jayme Vasconcellos, [19--]. In-8.º (19x13,5 cm) de 124, [4] p. ; il. ; B.
1.ª edição.
Ensaio complexo e algo insólito de um padre católico que interpreta fenómenos inexplicáveis à luz da Bíblia.
Ilustrado com dois desenhos em página inteira.
Estudo raro e muito curioso, publicado, julgamos, na primeira/segunda década do século XX. Nada foi possível apurar acerca desta obra ou do seu autor por total ausência de referências biobibliográficas. A Biblioteca Nacional não menciona.
"Os estudos feitos, n'este livrinho sobre assumptos tão momentosos e de tão difficil comprehensão e interpretação, eu os declaro inteiramente pessoaes, por mim investigados sobre a Sagrada Escriptura e doutrina dos Santos Padres e Doutores da Igreja."
(Excerto do preâmbulo - Protestação)
"O obscuro sacerdote que elaborou as humildes paginas d'este livrinho, tem colhido já da vida as mais duras desillusões. Tendo viajado assaz atravez de terras e mares, tem aprendido a conhecer o mundo, os seus enganos, todas as suas protervias, toda a immensa degradação moral a que tem baixado a especie humana. A sua educação religiosa bebida com o leite maternal, lapidada mais tarde atravez da leitura, da meditação e do estudo, alicerçou-lhe bem fundo n'alma conclusões seguras e inabalaveis sobre o futuro do homem, post mortem, sobre a origem celeste e immortalidade do espirito humano, sobre, emfim, todas as doutrinas da Biblia, que considera, após todas provas e contra-provas, a que a tem sugeitado, como sendo um livro d'inspiração divina, a autentica palavra de Deus ensinada aos homens, o unico codigo as verdades eternas e irrefragaveis que devem illuminar e guiar as intelligencias e os corações de todas as almas que na terra caminham para o incognoscivel infinito."
(Excerto de Palavras prévias)
Index:
[Protestação] | Palavras prévias | I - Signaes dos tempos. II - A Prophecia. III - A Tradição. IV - A Historia e a Mystica. V - A Razão. VI - O Anticristo. VII - A Ressurreição dos mortos. VIII - O Millenio. IX - O Renovamento do Ceu e da Terra. X - O numero dos Eleitos. XI - Ultimas palavras.
Exemplar brochado em bom estado de conservação. Com sublinhados e notas a tinta nas últimas páginas do livro.
Raro.
Sem registo na BNP.
75€
Reservado

17 novembro, 2024

FREIRE, João -
A INSTRUÇÃO E O USO DE ARMAS BRANCAS NA MARINHA. [Lisboa], Academia de Marinha, 2018 [2019]. In-4.º (24x17 cm) de 47, [1] p. ; il. ; B.
1.ª edição.
Ensaio histórico sobre o ensino e manejo de armas brancas na Armada Portuguesa.
Ilustrado no texto com fotografias a cores.
Exemplar valorizado pela dedicatória autógrafa do autor.
Estudo interessante e muito curioso, para colecção.
Tiragem limitada a 200 exemplares.
"Neste estudo, que se refere à Armada portuguesa desde finais do século XVIII até à actualidade, consideramos sucessivamente o caso do emprego do sabre-de-abordagem nos últimos tempos da marinha de vela, a esgrima-de-baioneta aprendida pelo pessoal da infantaria-de-marinha e, por último, o ensino da esgrima na Escola Naval."
(Excerto da introdução - "A Instrução e o Uso de Armas Brancas na Marinha")
Índice:
"A Instrução e o Uso de Armas Brancas na Marinha" | 1 - O Sabre de Abordagem, na Marinha de Vela. 2 - Esgrima de Baioneta, para a Infantaria de Marinha. O emprego do punhal nos fuzileiros. 3 - O Ensino da Esgrima na Escola Naval. A instrução de esgrima na EN depois de 1910.
Exemplar em brochura, bem conservado.
Muito invulgar.
Com interesse histórico e bibliográfico.
30€

16 novembro, 2024

MOREIRA, António Soares -
O MAJOR OU TENENTE-CORONEL EANES
. Porto, Edição do Autor, 1977. In-8.º (18,5x12,5 cm) de 15, [1] p. ; il. ; B.
1.ª edição.
Curioso opúsculo da época, crítico de Ramalho Eanes, - "militar e político português, notório por ter sido o 16.º presidente da República e o primeiro democraticamente eleito após a Revolução de 25 de Abril de 1974", - cuja meteórica progressão na hierarquia militar é o ponto de partida e pretexto para "implicar" com a figura do general.
Ilustrado com retrato do autor no verso da f. rosto.
"No fim do jantar ligaram a televisão e mais uma vez nos impressionou aquele rosto excessivamente sério, talhado em material tão áspero que nenhuma espiritualidade foi possível transmitir-lhe. Esforçamo-nos por procurar naqueles traços pouco definidos, apenas esboçados, secos, algo de delicado. Aquelas linhas duras, espessas, compactas, antipáticas, a expressão imóvel, o olhar parado, carregado, dá-nos que pensar.
No major ou tenente-coronel Eanes não se descortina nada de interessante. De interessante é o que tem a menos. Tudo neste homem muito teso e inexpressivo lembra um «robot», ou, quando muito, uma anatomia de museu anatómico, uma câmara funerária, os sentidos pêsames. Mas, vistas bem as coisas, estudado o homem e a sua acção, ele não é tão hermético como isso. Concluímos ser um indivíduo pouco inteligente que, por má interpretação da História julga ter uma missão a cumprir. [...]
*A insistência com que o autor utiliza as palavras - major ou tenente-coronel Eanes - não deve ser atribuída à preocupação de se fazer ironia fácil. O facto justifica-se porque o autor tentou informar-se sobre qual o posto do sr. Eanes no exército, e não conseguiu obter um esclarecimento definitivo, embora tenha interrogado muitos oficiais com os postos de capitão, major, tenente-coronel, coronel e general."
(Excerto de O major ou tenente-coronel Eanes)
Exemplar brochado em bom estado de conservação. Capa apresenta leve sombreado por acção da luz.
Invulgar.
10€

15 novembro, 2024

FRANCO, Chagas - AS SACRIFICADAS (memorias duma madrinha de guerra). Lisboa, Livraria Editôra Guimarães & C.ª, [1918?]. In-8.º (18 cm) de 255, [1] p. ; E.
1.ª edição.
Relato pungente, verídico, da saga de uma moça portuguesa - Suzana - que vai ao encontro do namorado, um oficial português do C.E.P., de licença em Paris, seguindo depois com ele para a Flandres, onde fica instalada a 20 kms do front. A história acaba mal. Dois meses depois, Fernando de Ataíde - o noivo da rapariga - encontra-se preso ao leito num hospital de Mervillle, ferido de morte nos combates que antecederam a batalha do Lys; por se recusar a abandonar a cabeceira do rapaz e bater em retirada com os demais, Susana foi importunada e seviciada por soldados alemães, sendo mais tarde resgatada pelas forças inglesas.
A Segunda Parte é integralmente dedicada à correspondência de Fernando para Susana- não censurada - aqui reproduzida.
"Uma noite, no pequenino hospital de Dohen, entre os dois habituais bombardeamentos de Saint-OMer, contaram-me esta impressionante historia.
Tempos depois, em Paris, conheci a admiravel mulher que coligia as «Memorias» que vão ler-se: ela era tão santa na sua resignação como tinha sido nobre no seu sacrificio.
Nada, ou quasi nada, tive de alterar nas suas notas tão documentadas pela dôr, tão vividas, tão humanas, tão flagrantes: elas tinham sido a esperança, a anciedade, o frémito, a agonia de cada minuto do seu coração; elas exprimem a vida daqueles tragicos tempos - elas são a verdade
Possa a comoção dos meus leitores engrandecer a minha homenagem - a homenagem do meu respeito alargado do luto dessa mulher sublime ao de todas aquelas que «sofrêram para a redenção do mundo», de todas que, como ela, fôram sacrificadas."
(Preâmbulo)
"Meu tio, já no estribo, abraçára-me, beijára-me quasi rudemente, com uma lagrima na face:
- Adeus! Juizo e boa fortuna...
Era noite já; e, debruçada á portinhola, subito comovida, eu via-o ainda á luz dos arcos voltaicos, com as suas malas e o seu casacão de viagem, muito amplo, côr de mel, ao longo dessa gare de Bordeus, onde êle tivera de deixar-me.
Ficava assim completamente entre estranjeiros; e o meu sonho parecia-me agora mais temerario e mais vão e a minha coragem mais frouxa, quási fatigada já - e todo o nobre impulso do meu coração, correndo após o amor, uma quimera apenas distinta num mundo de quimeras. [...]
Eu ia só, aos vinte anos, nesse país que o meu espirito havia tanto amava, em demanda do meu amor saudoso - mas ele estava áquela hora bem longe sem me poder valer no fundo ignorado de uma trincheira escura, e nos sucessos daquela noite claramente eu via a dissolução desse país em guerra, os ultrajes que me esperavam."
(Excerto da Primeira Parte - Cap. I)
"Hoje de manhã, quando desci á primeira linha, num intervalo breve da trovoada, sob o sol de fogo, o Patachão aproximou-se de mim, tristemente:
- Deixe-me saltar o parapeito, deixe-me ir busca-lo...
Logo o Evaristo, o cabo de olhos negros, habitualmente tão silencioso e tão grave, me explicou o caso estranho: durante a noite, um dos da patrulha, o José da Roleta, patricio do Patachão, tinha lá ficado sem dizer ai, crivado pelos estilhaços. E a sessenta metros apenas, no meio dos arames contorcidos, emaranhados pela metralha, negros das chuvas e dos gazes, eu via o cadaver com os baços abertos, a face caída na lama, todo inteiriçado, enorme, singular no seu abandono.
- Deixe-me ir buscá-lo...
Neguei. Afastei-me contrariado. [...]
- Os ratos vão comê-lo. Deixe-me ir buscá-lo.
E eu fui ao telefone pedir para o batalhão a licença necessaria. Mas o major declinou a responsabilidade, telefonou para a brigada. Por fim, resmungadamente, veio o indeferimento que eu esperava.
Então, num desespero que eu não pude conter, que ninguem podia conter, o Patachão saltou no parapeito, só e sem armas, prescrutando, um momento com os grandes olhos meridionais, vagamente loucos, a trincheira inimiga. Depois começou a correr pela Terra de Ninguem, através dos charcos e das crateras, desesperadamente, abrindo as enormes pernas em passadas tão vivas, tão loucas, como se, aproveitando o assombro de todos nós, fôsse a desertar.
Alguns tiros isolados vindos do parapeito contrario não conseguiram detê-lo; estava já no meio dos arames, junto do cadaver.
Depois, um momento, todos vimos a face do morto soerguer-se na lama, os seus braços agitarem-se, logo cairem como duas hastes rigidas, pesadamente, em cruz. [...]
Mas era evidente que um homem só nada poderia contra aquela imobilidade marmorea, tão querida e tão pesada.
Então o Evaristo correu a ajudá-lo, sem uma palavra, no seu grave silencio - e eu quasi lhe gritei um «bravo!» ao vê-lo correr assim.
Todos os meus homens estavam agora de pé no parapeito, palidos, ansiosos, esquecendo o perigo, esquecendo as armas! E lá em baixo, defronte de nós, na trincheira alemã, outros soldados erguiam-se, porventura palidos tambem, esquecendo tambem a guerra, abandonadas tambem as armas. Depois, quando o morto foi transportado enfim, livida a face, as pernas já tumefactas, bamboleantes, escorrendo lôdo dos charcos fétidos, os soldados alemães e os nossos simultaneamente fizeram a mesma continencia nobilissima nessa funerea tregua inesperada, triste confraternização da morte."
(Excerto da Segunda Parte - IV)
Sezinando Raimundo das Chagas Franco (1878-1944). Militar, escritor, político e professor português. Major de Infantaria, integrou as forças do C.E.P. em França, onde combateu. Foi professor de História no Colégio Militar e "leitor" de Língua e Literatura Portuguesa na Universidade de Rennes, França (1921).
Encadernação em meia de pele com ferros a negro e a ouro na lombada. Sem capas de brochura.
Raro.
Com interesse histórico.
85€
Reservado

14 novembro, 2024

CRESPO, Gonçalves - NOCTURNOS. Lisboa, 18, Rua Oriental do Passeio [Imprensa Nacional], 1882. In-8.º (19 cm) de 164, [ ] p. ; E.
1.ª edição.
Edição original de uma das mais apreciadas obras do autor, dedicada a Maria Amália Vaz de Carvalho, sua mulher.

"Aquelle que alli vae triste e cançado
E mais tremente que os juncaes do brejo
Foi outrora o mais bello e o mais amado
Entre os moços do antigo logarejo.

Nas fitas d'esse labio desmaiado
Quantas mulheres tremulas de pejo
Não sorveram os néctares do beijo
Dos trigaes sobre o leito perfumado!

Hoje é velhinho, e falla dos francezes
Aos rapazes da eschola, e ás raparigas
Que não cançam de ouvil-o... As mais das vezes

Sobre a ponte, sósinho, ouve as cantigas
Das que lavam no rio, e o olhar extende
Ao sol que ao longe na agonia esplende..." 

(O Velhinho)

António Cândido Gonçalves Crespo (Rio de Janeiro, 1846 - Lisboa, 1883). Natural do Rio de Janeiro, Brasil. Veio residir para Portugal aos 10 anos de idade. Inscreveu-se na Universidade de Coimbra onde se viria a formar em Direito. Aí iniciou-se nas lides literárias, como colaborador de A Folha, fundada em 1868 por João Penha, por muitos considerado o introdutor do «Parnasianismo» em Portugal,  corrente a que aderiu. Foi o autor de Miniaturas (1870) e Nocturnos (1882), expressando-se em poemas com reminiscências da vida familiar e cenas do quotidiano. Gonçalves Crespo foi ainda deputado pela Índia, nas legislaturas de 1879 e 1882, e trabalhou no Diário da Câmara dos Pares, assim como colaborou no Jornal do Comércio, Artes e Letras, Cenáculo e na revista Ocidente. Ainda estudante, em 1874, casou-se com a conhecida escritora Maria Amália Vaz de Carvalho cuja tertúlia literária frequentava. Escreveram em conjunto Contos para os Nossos Filhos (1886).
Encadernação em meia de percalina com ferros gravados a ouro na lombada. Sem capas de brochura.
Exemplar em bom estado de conservação. Escritos numa página no interior do livro e pequenas manchas de acidez. Dedicatória coeva (não do autor) na f. ante-rosto.
Raro.
25€
Reservado

13 novembro, 2024

NORONHA, Eduardo de – DIARIO DE UM POLICIA.
Scenas da politica e da rua, anotadas pelos jornaes
. Lisboa, Guimarães & C.ª, 1919. In-8.º (18,5 cm) de 232 p. ; E.
1.ª edição.
Obra satírica e muito invulgar sobre a Lisboa "subterrânea" da época, das menos conhecidas da bibliografia do autor.
Trata-se do Diário do guarda 444, Bonifácio da Madre de Deus, da 12.ª esquadra de Lisboa.
Obra não mencionada na Biblioteca Nacional.
"Vejamos quem era essa prestante entidade policial, que, de indole curiosa, methodica, systematica, por inspiração sua ou por suggestão alheia, se lembrou de redigir um Diario onde, n'uma serie de apontamentos lançados á pressa, um tanto atabalhoadamente, sem preoccupações gramaticaes, é certo, registou todos os acontecimentos que presenceava ou de que tinha conhecimento. O seu espirito de ordem levou-o a authenticar, ou melhor, a condimentar esse Diario collando ao lado as noticias referentes a esses successos publicadas nos jornaes de maior circulação. O diario regorgitava de notas, de factos, de observações, constituia um vasto, um amplo repositorio dos incidentes e episodios da vida politica e social de Lisboa."
(Excerto do texto)
Indice:
I – Atroz desapontamento. II – Episodios e caricaturas. III – Gatunos e receptadores. IV – Larapios e rufias. V – Arruaças e arruaceiros. VI – Artistas de… cabeça. VII – Casamentos e lôgros. VIII – O «flirt» do animatographo. IX – Subsistencias e… falsificações. X – A nove I… XI – Somnambulas e videntes. XII – Superstições e candices.
Encadernação em percalina com ferros gravados a ouro na lombada. Conserva as capas de brochura.
Exemplar em bom estado de conservação.
Raro.
Sem registo na BNP.
30€

12 novembro, 2024

DUMAS, Alexandre - A MÃO DO FINADO.
Segunda parte do Conde de Monte-Christo. Por... Edição illustrada para Portugal e Brazil
. Rio de Janeiro : Lisboa, Editora - Empreza Litteraria Fluminense de A. A. da Silva Lobo, [18--]. In-4.º (23,5 cm) de 366, [2] p. ; [10 f. il. ; E.
1.ª edição brasileira.
Anunciado como a continuação do Conde de Monte Cristo, e dada por inúmeras fontes bibliográficas como mais um romance de Dumas, a presente obra foi afinal escrita pelo portuguesíssimo Alfredo Hogan a instâncias de um editor - também ele português - pouco escrupuloso no que à questão dos direitos de autor diz respeito, como aliás era usual na época. Originalmente publicado em 1853 (e traduzido para o francês(!) no mesmo ano), A mão do Finado é uma verdadeira pérola para os apreciadores do romance de "capa e espada", bem como da obra de Hogan (ainda pouco divulgada), e porque não dizê-lo, de Alexandre Dumas, autor de culto da literatura romântica-histórica, cuja produção atingiu o apogeu em meados do século XIX com a publicação das conhecidas obras Os três Mosqueteiros (1844) e O Conde de Monte Cristo (1844-46), e que terá tentado - sem sucesso - junto de algumas editoras internacionais desmentir a paternidade deste título. Resta dizer que, posteriormente, seriam publicadas outras sequelas do best seller de Dumas, sendo a mais conhecida O filho do Monte Cristo (1881), de Jules Lermina, com tradução para o português (1897).
Versão brasileira não datada (anos 80/90 do século XIX). Trata-se de uma variante ilustrada com 10 belíssimas estampas litografadas a cores em folhas separadas do texto.
"Quando a desgraça e a fatalidade nos opprimem, não falta quem venha, como o sorriso nos labios e o prazer n'alma, para nol-o fazer compartir, se a miseria não quebrou positivamente o prestigio dos nossos antigos haveres.
É esse prestigio o que attrae ao nosso lado todas as pessoas que nos conheceram e vêem vergados ao peso da fatalidade.
A baroneza Danglars, se bem que houvesse soffrido esse peso formidavel, reunia ainda em sua casa os principaes cavalheiros do Gand e tinha o prazer de ouvir nomear as suas douradas salas em Paris, como as que melhor sabiam receber e accomodar, por espaço de algumas horas, a todos esses impios elegantes do panno verde, a quem parece nunca faltar o ouro e a vontade de jogar, comtanto que não se procure conhecer os variados systemas da sua vida privada.
O espirito de orgulho e ambição da interessante baroneza Danglars, a sua figura esbelta e o seu rosto aristocraticamente pallido, onde brilhavam ou se amorteciam dois bellos olhos negros, conforme aquelle seio de rijas carnes se dilatava com a expansão d'um brando sentimento, ou se comprimia dominado pela ambição, não era o que menos attrahia numerosa concorrencia ás suas salas.
Aos que vivem de commoções fortes, nunca desagrada uma mulher como a baroneza Danglars. As suas risadas de orgulho, o seu gesto determinado e arrogante, mas submisso e meigo quando se deixava vençer, o seu olhar eloquente e sagaz, a sua extrema verbosidade, tudo concorria para que os mancebos do tom a inscrevessem no rol da leôas, apezar de ter passado já a primavera da vida.
Tal era a consideração em que estava a baroneza Danglars no anno de 1837."
(Excerto do Cap.I - Quem já havia jogado na alta e baixa dos fundos)
Alfredo Possolo Hogan (1830-1865). "Nasceu e faleceu em Lisboa. Funcionário dos correios, cultivou a literatura negra, tornando-se um romancista e um dramaturgo bastante popular em Lisboa. Nas suas obras notam-se influências de Eugène Sue e Alexandre Dumas. Escreveu vários romances históricos, como Marco Túlio ou o Agente dos Jesuítas (1853), Mistérios de Lisboa (romance em 4 volumes, 1851), Dois Angelos ou Um Casamento Forçado (romance em 2 volumes, 1851-1852), etc. Das peças de teatro, destacam-se: Os Dissipadores (1858), A Máscara Social (1861), Nem Tudo que Luz É Oiro (1861), A Vida em Lisboa (em parceria com Júlio César Machado, 1861), O Dia 1º de Dezembro de 1640 (1862), As Brasileiras; Segredos do Coração e O Colono. Foi-lhe atribuída a autoria do romance A Mão do Finado (1854), publicado anonimamente em Lisboa, pretendendo ser a continuação de O Conde de Monte Cristo de Alexandre Dumas."
(Fonte: http://alfarrabio.di.uminho.pt/vercial/hogan.htm)
Alexandre Dumas (1802-1870). "Nasceu em Villers-Cotterêts, Aisne, França. Foi um romancista e dramaturgo francês, autor das obras Os Três Mosqueteiros e O Conde de Monte Cristo, clássicos do romance de capa e espada de grande aceitação popular. Em 1818, passando por dificuldades financeiras, trabalhou num cartório da cidade. Conheceu Adolphe von Leuven, nobre sueco refugiado em França. Em 1821, junto com o amigo Leuven, escreveu a peça O Major de Strasburgo. Em 1823, foi morar em Paris. Em busca de emprego foi recebido pelo General Foy, amigo de seu pai, que ao ver a sua bela caligrafia concluiu que Dumas poderia secretariar o Duque de Orléans, futuro rei Luís Filipe. O emprego garantiu-lhe o sustento e abriu-lhe o caminho para a Comédie Française."
(Fonte: wook)
Encadernação meia de pele com ferros gravados a ouro na lombada. Sem capas de brochura.
Exemplar em bom estado geral de conservação. Assinatura de pertença na f. ante-rosto. Páginas ligeiramente oxidadas. A 9.ª estampa está "pegada" à folhinha de protecção.
Raro.
Peça de colecção.
60€

11 novembro, 2024

PAÇO, Tenente Afonso do - CARTAS ÀS MADRINHAS DE GUERRA. Fac-simile da 1.ª edição. Viana, Junta de Freguesia de Outeiro, 1993. In-8.º (17,5 cm) de [8], 182, [2] p. ; B.
Edição restrita publicada pela Junta de Freguesia do Outeiro, localidade natal do autor.
"As Cartas às Madrinhas de Guerra, cuja 1.ª edição saiu em 1929, no Porto, são uma colectânea de 43 cartas, cujo autor foi o então jovem Ten. Afonso do Paço, nascido no lugar de Além do Rio, da freguesia de Outeiro, concelho de Viana do Castelo, que combateu na Grande Guerra, de 1914 a 1919.
As primeiras 18 cartas foram escritas, durante o período desgastante da guerra nas trincheiras, as 20 seguintes, nos campos de concentração de Lile, Rastatt e Breesen, depois de ter ficado prisioneiro dos alemães, em 9 de Abril de 1918, e as 8 últimas, desde a saída da Alemanha até ao regresso a Portugal.
Como o título do livro deixa adivinhar, as cartas tiveram por destinatárias as Madrinhas de Guerra, que, conforme o autor afirma, foram os "entes mais queridos da guerra, que lançaram sobre as trincheiras regadas de sangue catadupas de amor e carinho…".
É, quanto a mim, um livro indispensável para bem conhecer o período de guerra nas trincheiras e a vida dos prisioneiros nos campos de concentração da Alemanha, a que ele chamou gefangenismo, criando um neologismo de origem germânica, a partir da palavra gefangen que significa "prisioneiro".
[…]
Através de páginas comoventes e deliciosamente escritas, perpassam diante dos nosso olhos, como numa tela animada e colorida, cenas patéticas da Grande Guerra. A vida periclitante dos soldados nas trincheiras insalubres, ensopadas de lama e incessantemente metralhadas pelos ataques inimigos; a tragédia dos prisioneiros nos campos de concentração, ralados pelas agruras da fome, da doença e do abandono; a hecatombe de 9 de Abril, na planície de La Lys, em que, apesar de vencidas, “as nossas tropas de linha se bateram com denodo, digno dos nossos maiores”, reconhecido com termos honrosos pelos próprios alemães."
(Excerto do prefácio de José Luís Branco)
Exemplar brochado em bom estado de conservação.
Invulgar.
20€

10 novembro, 2024

MESNIER, Pedro Gastão -
O JAPÃO : estudos e impressões de viagem.
Por... Macau, Typographia Mercantil, 1874. In-8.º (22x14 cm) de XX, [2], 355, [5] p. ; il. ; E.
1.ª edição.
Importante contributo para a história do Japão contemporâneo como nação emergente e, tal como a China, a dar os primeiros passos no processo de abertura ao Ocidente. Escrito algumas décadas antes do estabelecimento de Wenceslau de Moraes no país, que descreveu com mestria, este é um dos mais interessantes contributos históricos escrito por um cidadão português sobre o país do Sol Nascente. Inclui largas referências à passagem - e influência - dos portugueses pelo império nipónico.
Livro impresso em Macau, ilustrado com caracteres chineses (poesia) e, no final, com tabelas e quadros estatísticos.
"Dedicada ao Visconde de S. Januário, ministro plenipotenciário de Portugal nas cortes do Sião, China e Japão, esta obra constitui eventualmente o ex-libris entre os trabalhos de reconhecimento do Japão recém-aberto aos contactos internacionais. Memória da embaixada que em finais de 1873 S. Januário encabeçou, transporta também uma reflexão profunda sobre as relações entre o Ocidente e o Oriente. Declarado admirador das reformas ocidentalizantes do mikado, pressentia o poder decisivo que o arquipélago desempenharia nas décadas subsequentes. - Contém: notícias do Japão, da Antiguidade aos contactos com os europeus; carácter do povo nipónico, suas instituições morais, religiosas e políticas; visita a Nagasáqui; os portugueses no Japão (1541-1610); Kobe; Osaka: divertimentos, artes, os últimos samurais; Yedo -Tóquio: templos Xintoístas, palácios, bosques, a nova elite dirigente, os divertimentos; o sistema de crenças; fisionomia e trajo dos japoneses; audiência dada pelo imperador à embaixada portuguesa. - Em anexo, glossário de “palavras asiáticas”, bem como quadros sinópticos da divisão territorial do Japão, cronologia de imperadores, tábua cronológica dos Shonguns e constituição da família imperial.
De 1860 aos anos 30 do século XX, o Japão converteu-se numa nação fortemente ocidentalizada. Coube a Pedro Gastão Mesnier (1846-1884) lavrar testemunho das profundas alterações em curso no país. Integrando a embaixada do Visconde de S. Januário, pode aperceber-se do triunfo do xintoísmo e do culto rendido ao imperador - cuja linhagem divina ascenderia até Amaterasu, deusa do Sol - mas também do colapso dos samurais e ascensão dos grandes barões monopolistas do comércio e da indústria zaibatsu. O Japão seguia velozmente a via ocidental e era já considerado, em meados de 1880, um aluno exemplar, havendo quem o brindasse como “a Inglaterra da Ásia”, que décadas depois Haushoffer – o mago da geopolítica – corrigiria para a de “Prússia do Oriente”."
(Fonte: https://purl.pt/711/1/japao/jp-05.html#)
"Nunca me acompanhou a pretensão de esgotar o assumpto de que trata a obra presente, durante todo o decurso de tempo em que escrevi este livro. [...]
Tive especialmente em vista, quando escrevi, os meus patricios de Portugal, para quem a maior parte das cousas relativas ao Japão são novidades; os meus patricios de Macau, e d'estas regiões, relevarão portanto o que para elles não passará de logares communs.
Emquanto ás impressões que exponho, é possivel que muitas pessoas que viajaram no Japão, não as sentissem analogas, mas isso lhes não dará o direito de duvidar da sinceridade das minhas.
Por experiencia, tenho conhecido que a simples verdade, em todas as cousas d'arte, tem sempre a vida que é o principal predicado da belleza, e que é em vão que se procura a formosura litteraria nas formulas rhetoricas. Com alma que sente bem, e penna que reproduz exactamente esses sentimentos, se fazem os bons escriptores.
Procurei restringir-me sempre á mais exacta reproducção das cousas que presenciei; é certo que não vi tudo, e que muitas vezes não vi bem. A arte de ver é talvez a mais difficil d'este mundo, e não presumo ser mestre n'ella."
(Excerto do Prefacio - Ao limiar)
Índice:
Prefacio | Erratas | I - A descoberta. Observações geraes. II - Nagasaki. III - Os portuguezes no Japão, 1541-1640. IV - O mar interior. V - Hiogo-Kobe. VI - Osaka. VII - O valle d'Oitz. VIII - A lenda de Tajamir. IX - Yeddo - En-rio-kan. X - Yeddo - O-tamaya. XI - Uiéno. XII - Yeddo - As casas de Chá. XIII - Asaka. XIV - Physionomias e trajos. XV - Folhas caídas do feudalismo XVI - A audiencia. XVII - Ultimas excursões | Glossario de palavras asiaticas | Appendices e notas.
Pedro Gastão Mesnier (1846-1884). "Erudito e homem de acção cuja aura romântica o equiparava a um moderno Fernão Mendes Pinto, no entender de Manuel da Silva Gaio e dos seus amigos literatos de Coimbra, fugia decididamente aos cânones da sua época. [...]
A ansiedade de conhecer o Oriente fê-lo embarcar para Moçambique e daqui para a Índia, onde “obtivera por influência de seu pai, um despacho para condutor das obras públicas de Goa”, tendo sido também “professor de física e química na escola militar de matemática de Goa”. Contudo, uma “revolta do exército indígena” e a ocupação do arsenal, foi a oportunidade soberana para Pedro Gastão Mesnier mostrar as suas qualidades em acção. Por incumbência do Visconde de S. Januário, Governador-Geral da Índia (1870-1871), cujo secretário era o poeta Tomás Ribeiro, foi encarregado de “apreender esses quatro canhões às proximidades de Hari-Bandar”. A missão foi bem sucedida, tendo “praticado actos de verdadeiro heroísmo”, relatados no “Times of India”. [...]
A sua obra vai aparecendo. O “Idyllio” é publicitado pela Typographia Mercantil e custava 50 avos, em 1874. Outro livro, desse mesmo ano, “O Japão: estudos e impressões de viagem”, será muito bem recebido por Antero de Quental que escreveu na “Revista Ocidental”, “há muito tempo que em língua portuguesa se não publica relação de viagem tão interessante, tão cheia de novidade e ensino, como esta”. Antero informa-nos ainda que “os ingleses de Hong Kong, juízes competentes em tal matéria, dando ao livro do viajante português as honras de uma tradução, que apareceu na China Review, importante revista que se publica naquela cidade”.
Em 1878 segue novamente como secretário do Visconde de S. Januário, numa missão diplomática na América do Sul que incluía a Argentina, a Bolívia, o Brasil, adoecendo gravemente no Paraguai. Regressa combalido a Lisboa, procurando na escrita e no jornalismo algum conforto e algum sentido para uma vida cada vez menos aventurosa. [...]
A doença fazia o seu caminho inexorável. [...] Era o fim de um atleta que "atravessou o Tejo a nado, a 12 de Agosto de 1875, desde o Terreiro do Paço até ao pontal de Cacilhas, em competição com o sr. Alfredo Ansur, que cansou a meio da travessia"."
(Fonte: https://jtm.com.mo/opiniao/pedro-gastao-mesnier/)
Encadernação coeva em meia de pele com ferros gravados a ouro na lombada. Sem capas de brochura.
Exemplar impresso em papel encorpado em bom estado geral de conservação. Algumas páginas apresentam acidez.
Raro.
Com interesse histórico.
250€

09 novembro, 2024

PATRICIO, Arthur - NA BARRICADA DA ROTUNDA : episodios interessantes do movimento revolucionario. 
[Por]... 1.º Cabo de Artilharia N.º 1
. Lisboa, Centro Typographico Colonial, 1912. In-8.º (21 cm) de 47, [1] 
p. ; [1] f. il. ; [1] f. desdob. ; il. ; B.
1.ª edição.
Relato do ambiente que se viveu em Lisboa ao longo do dia 5 de Outubro de 1910, particularmente na Rotunda. Trabalho "escripto na cazerna, quando recruta nas horas de folga da instrucção" por um simpatizante da causa revolucionária, testemunha ocular dos acontecimentos, que dedica o opúsculo aos seus "camaradas do heroico e glorioso Regimento de Artilharia n.º 1, aos carbonarios e a todos os que contribuiram para a implantação da nossa querida Republica."
Livro ilustrado com fotogravuras dos participantes nos combates ao longo do texto, em separado com um retrato do autor, e em folha desdobrável à parte, "o heroe Raphael Miguel", junto com o grumete artilheiro Alfredo Gomes Froes, ambos resistentes ao fogo das forças de Queluz comandadas por Paiva Couceiro. Inclui ainda o retrato de destacados lideres republicanos: Miguel Bombarda; Bernardino Machado; Machado dos Santos; Magalhães Lima; Afonso Costa; Teófilo Braga; João Chagas.
"Antes de entrar no assumpto a que o titulo se refere, julgo conveniente explicar o seguinte:
Tive a felicidade de ser testemunha do audacioso movimento que proclamou a Republica, e estou portanto ao alcance de narrar os acontecimentos que os meus olhos viram. Ao tempo ainda era paizano, trabalhava pelo officio de impressor no Centro Typographico Colonial, largo da Abegoaria, 27."
(Excerto do preâmbulo, Leitores)
"[...] Os soldados conviviam com os grupos revolucionarios civis no mais amplo e fraternal amplexo, deitando-se alguns na verde relva á sombra das palmeiras, outros fumando reclinados nos selins dos muares, olhando para o cigarro, como que perguntando a si proprios se seria aquelle o ultimo que saboreavam...
Estendidos na relva, viam-se muitos populares bem trajados, com carabinas na mão, e toda a casta de armamento, taes como revolveres, pistolas automaticas, facas, espadas, sabres, etc., e que fallavam em voz baixa, incutindo uns aos outros coragem no sacrificio de darem o seu sangue pela Republica, de morrerem por ella, visto estarem metidos n'aquella aventura para a vida ou para a morte. [...]
Já tinha visto o Machado Santos, o unico e heroico official que commandava aquellas forças, codjuvado por sargentos que, como elle, tambem andavam a cavallo, percorrendo a frente do acampamento dando ordens. [...]
Tinha o rosto sereno, a fronte lisa, e não mostrava inquietações; os soldados que ao principio, quando eu cheguei, pareciam indisciplinados, recebiam agora as ordens, que cumpriam com escrupulosa exactidão. [...]
Assisti nas terras do Parque Eduardo VII ao combate com a bateria de Queluz e estive em risco de ser victima; pelos atalhos que iam dar ao quartel de artilharia avançavam constantemente numerosos grupos armados com espingardas que levavam e transmitiam ordens, expondo-se assim a uma morte inevitavel. [...]
Começou a circula a noticia da approximação de artilharia de Santarem, que vinha em attitude hostil, e de um provavel desembarque de dois mil marinheiros, que, tomando o quartel general aos monarchicos, viria avenida acima, para secundarem o feliz exito do movimento."
(Excerto da narrativa)
Exemplar brochado em bom estado geral deconservação. Capas frágeis, manchadas, com pequenos defeitos.
Raro.
Peça de colecção.
35€

08 novembro, 2024

OSORIO, Antonio de Sousa Horta Sarmento -
A INSUBORDINAÇÃO DO VASCO DA GAMA
. Lisboa, [s.n.], 1906. In-8.º (22x16 cm) de 31, [1] p. ; B.
1.ª edição.
Aclaração do advogado Sarmento Osório a propósito da sentença condenatória proferida contra parte da tripulação do cruzador Vasco da Gama, pelo levantamento ocorrido em Abril de 1906.
"A 13 de Abril de 1906 verificou-se uma amotinação de marinheiros dos cruzadores D. Carlos e Vasco da Gama, em protesto contra as condições de vida a bordo. O governo enviou o almirante Ferreira do Amaral que tentou a todo o custo pôr termo à insurreição, fazendo diversas promessas. A repressão foi dura ... 41 reclusões de 15 a 20 anos e deportações para as colónias, além de penalidades menores."
(Fonte: https://www.portosdeportugal.pt/detail.php?nID=8291)
"As sentenças do tribunal de S. Julião da Barra, que o Supremo Conselho vem de confirmar, deixaram em todo o paiz uma funda impressão de dó.
Esperava-se, é certo que os marinheiros accusados fossem condemnados; toda a gente pensava que as auctoridades superiores da armada, porventura principaes culpadas da indisciplina dos marinheiros, haviam de fazer cahir sobre elles todo o pezo d'uma justiça, a que bom é não chamar vingança. E no entanto ninguem esperava tanto. Quando a primeira sentença foi conhecida deixou em todos uma impressão de pasmo. Era demais!
E a simples expectativa ansiosa com que a opinião seguia o caso dos marinheiros, transformou-se de golpe n'um intenso movimento de protesto e de revolta.
Uma esperança ficava ainda: o Supremo Conselho, esse tribunal venerando de velhas reliquias do nosso passado militar, de cujas almas parecia que o bater dos annos devia ter varrido de todo os feros pruridos d'uma disciplina de chicote.
Essa esperança cahiu tambem.
Resta agora levar ao conhecimento da opinião aquillo que ella ainda ignora."
(Excerto do preâmbulo)
"O processo do «Vasco da Gama» foi, como não podia deixar de ser, deploravelmente organisado.
Na noite em que rebentou a insubordinação havia a bordo uns oitenta marinheiros. Vieram ao tribunal vinte e cinco. Crê alguem que, se os cincoenta e cinco restantes não tivessem tido a mais pequena participação no movimento, e se tivessem posto ao lado dos officiaes, a insubordinação podesse ter continuado?"
(Excerto de Organisação viciosa do corpo de delito)
Índice:
[Preâmbulo] | Organisação viciosa do corpo de delito | Como se apreciou a prova | A graduação das penas applicadas | A defeza nem quesitada foi! | Conclusões.
António de Sousa Horta Sarmento Osório (Lousã, 1882 - Lisboa, 1960). "Foi um advogado, professor universitário, ferroviário, jornalista, desportista, atleta olímpico, escritor e político português. Formou-se em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra a 27 de Junho de 1903. Na política, pertenceu ao Partido Progressista, e chegou ao Parlamento eleito Deputado pelo Círculo Eleitoral Plurinominal de Vila Real em 1905, de que prestou juramento a 10 de Abril de 1905. Em 1910, voltou a ser sufragado neste Círculo Eleitoral e, também, no Círculo Eleitoral Plurinominal da Horta, mas nunca chegou a tomar posse, em virtude da Revolução Republicana de 5 de Outubro de 1910. Abriu banca de Advogado e fez carreira na Advocacia, estando ligado a alguns processos relacionados com a banca, foi também Professor Universitário de Economia Política na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Publicou três obras, vários trabalhos sobre Matemática Aplicada, sobre questões jurídicas, etc, e diversos opúsculos sobre temas jurídicos, sendo uma delas respeitante à insubordinação no navio Vasco da Gama, ocorrida a 13 de Abril de 1906, em que defendeu os marinheiros insurretos, e cuja receita de venda se destinou às famílias dos condenados."
(Fonte: Wikipédia)
Exemplar em brochura, bem conservado; contracapa ligeiramente enrugada.
Raro.
Com interesse histórico.
30€
Reservado

07 novembro, 2024

COELHO, Campos – UM ÊRRO JUDICIÁRIO : O 411 está inocente!
[Por]... Advogado. Lisboa, Editorial Labor, 1937. In-4.º (25,5 cm) de 290, [2] p. ; il. ; B.
1.ª edição.
Peça jurídica sobre o assassinato de Albino Barcelos, agente da P.S.P. do Funchal, em 6 de Fevereiro de 1931, no seguimento dos "gravíssimos tumultos, conhecidos pelo movimento das farinhas", que ocorreram naquela cidade insular.
Livro ilustrado com fotografias, desenhos e fac-símiles relativos à reconstituição do crime.
"O Crime da «Fábrica de S. Filipe». Pedido de Revisão da Sentença que injustamente condenou José Fernandes, na pena de 20 anos de degredo, por um crime de homicídio praticado por Fernando Faria «o Arguim» - apresentado ao Supremo Tribunal de Justiça pelo advogado Campos Coelho.
Redigimos esta petição, por amor à Verdade e em homenagem à honrada Justiça Portuguesa que, assim, desejamos servir modesta mas dedicadamente.
A sua publicidade, através deste livro, que tão insistentemente nos foi solicitada em nome da defesa do condenado, levará a todos os cantos da sua Ilha Maravilhosa o grito de protesto com que José Fernandes, há seis longos anos, heroicamente vem proclamando a sua claríssima Inocência!
Compreendendo e sentindo o perigo que corremos – acusando uma poderosa quadrilha de malfeitores – nem por isso deixaremos de abençoar o momento sublime em que entrámos nesta cruzada pela salvação do Inocente!"
(Excerto da introdução)
Encadernação simples meia de percalina com ferros gravados a ouro na lombada. Conserva as capas de brochura.
Exemplar em bom estado geral de conservação. Apresenta pequeno orifício de traça na capa, ao centro, junto ao festo, com pouca expressão, atingindo ainda a folha de rosto e a seguinte.
Muito invulgar.
Com interesse histórico e insular.
20€