26 março, 2025

PIMENTEL, Alberto -
AS NETAS DO PADRE ETERNO.
Romance original. Por... Lisboa, Livraria de Antonio Maria Pereira - Editor, 1895. In-8.º (18,5x12 cm) de [4], 175, [1] p. ; E.
1.ª edição.
Romance baseado em acontecimentos verídicos, cuja acção decorre em pleno Sexénio (1868-1874), período da história espanhola que tem início com o levantamento revolucionário conhecido por La Gloriosa (1868), e que passou a Portugal por força das multidões de refugiados que atravessaram a fronteira como puderam para salvar a vida, desenrolando-se a presente história no território nacional, sobretudo na zona de Setúbal.
Invulgar e muito interessante.
"Desde a primavera até ao inverno de 1873, decorre, na historia da moderna Hespanha, um periodo de rubra agitação demagogica, em que tanto a abandonada corôa da velha Monarchia de S. Fernando como o recente barrete phrygio da Republica fluctuam n'um mar de sangue, golphado do proprio coração d'esse bello paiz meridional, e sinistramente illuminado pelos reflexos coruscantes dos incendios de Alcoy, que eram o facho tristemente glorioso da insurreição cantonal.
Nação essencialmente catholica, a Hespanha viu profanados os seus templos, principamente em Barcelona, onde as mulheres, n'uma infrene orgia de bacchantes, envergavam as vestes sacerdotaes, entoando cantaraes obscenos, e derramando por sobre os altares o vinho que transbordava das taças.
Nas ruas, as allucinações da musa popular, terrivelmente revolucionaria, alternavam-se com as detonações dos fuzilamentos, e aos dithyrambos entoados á beira dos altares correspondiam, fóra dos templos, trovas sacrilegas, dissolventes, anarchicas. [...]
É certo que na alma popular da Hespanha não estavam de todo pervertidos os sentimentos cavalheirescos da raça castelhana, mas a revolução ia alastrando dia a dia o seu dominio, - em Sevilha era incendiada a calle de las Sierpes, em Cadiz punha-se em almoeda a custodia do Corpus Christi, em Malaga dois bandos rivaes porfiavam em horrores de barbarie, em Granada os desenfreamentos do vandalismo desmoronavam as instituições e os templos, como acontecia em Barcelona, em cujos campos os bosques incendiados chammejavam como enorme fornalha... [...]
Um illustre escriptor hespanhol, o sr. Vicente Barrantes, emigrando n'essa epocha para Portugal, escreveu sob o titulo de Dias sin sol, um livro interessante, em que estão consignadas as dolorosas impressões que as desgraças da Hespanha punham no coração dos seus angustiados filhos. Uma pagina d'esse livro diz:
«Com mão debil e porventura timida empunhou o tribuno Emilio Castellar as redeas da dictadura, ao tempo que a fronteira portugueza, onde eu me achava, offerecia um lancinante espectaculo. Cerrada a do norte pelos carlistas, era aquella a unica porta para escapar d'este inferno de Hespanha, e cada trem do caminho de ferro iberico parecia barcada de Acheronte, como aquellas que rangendo os dentes e blasphemando até dos paes de seus paes viu passar o grande poeta da Edade-Média pelo lodoso lago que ao inferno conduz... De Madrid, de Alcoy, de Cartagena, de Valencia, de Cadiz, de Sevilha, de Jerez chegavam por centenas familias dispersas, como quem foge de uma peste; e isto um dia e outro dia, e mezes inteiros; e récuas e caravanas de inoffensivos lavradores, de pacificos artistas, de laboriosos industriaes desembocavam simultaneamente por todas as povoações da fronteira, desde Barrancos a Setubal, desde Elvas a Lisboa, desde Zamora e Ciudad-Rodrigo ao Porto; misero formigueiro de emigrantes de todas as classes e condições, com os olhos voltados para Hespanha, mas receiando a cada hora que o horror os convertesse em estatuas, como á mulher da Biblia.»
Setubal, pela amenidade do seu clima, e pela belleza dos seus campos, hospedou uma importante colonia hespanhola, atravez da qual eu passeei algumas vezes os meus ocios de touriste. Principalmente no verão, em julho, que foi a epocha mais calamitosa da revolução, a affluencia de emigrados era numerosissima ali. E o que é verdadeiramente notavel é que os havia de todas as côres politicas, porque o perigo era egual para todos. A revolução não curava de perscutar as opiniões de cada um. Perseguia, roubava, incendiava, fuzilava indistinctamente. Já não era pequena felicidade poder fugir á morte, salvar a vida. Dos emigrados, conheci alguns ricos, poucos, e esses eram os que tinham logrado liquidar a tempo os seus haveres, antes que a santa federal se encarregasse da liquidação. D'este numero era a familia Saavedra, de Sevilha, que tem de figurar n'esta historia. Tres pessoas apenas: pae, mãe e filha."
(Excerto do Cap.I)
Alberto Pimentel (1849-1925). "Nasceu no Porto a 14 de Abril de 1849. Com uma obra extensa e variada, escreveu poesia, romance, teatro, biografia, obras políticas, entre outros géneros. Camilo Castelo Branco – que conheceu pessoalmente, lhe prefaciou dois dos seus livros e é matéria de algumas das suas obras – é o seu ídolo e o seu Mestre. Morreu em Queluz no dia 19 de Julho de 1925."
(Fonte: Wook) 
Encadernação do editor em percalina com ferros gravados a seco e a ouro e negro nas pastas e na lombada.
Exemplar em bom estado geral de conservação. Pastas apresentam desgaste marginal. Interior correcto.
Muito invulgar.
25€
Reservado

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