GALLIS, Alfredo - A BAIXA. Lisboa no Seculo XX. (A grande aldeia). Lisboa, Parceria Antonio Maria Pereira : Livraria Editora, 1910. In-8.º (19x12 cm) de [6], 394, [2] p. ; E.
1.ª edição.
Curioso romance de costumes de cariz erótico.
O autor, conhecido pela sua escrita sensual, descreve a baixa de Lisboa
em tudo quanto esta pode oferecer de mau e repreensível, atentatória da
moral e bons costumes da época, através dos "tipos" que a frequentam e
habitam.
Obra invulgar e muito curiosa.
"Ha
que explicar ao publico a synthese philosophica e sociologica d'esta
obra, antes de entrarmos na sua contextura litteraria propriamente dita.
Ao
raiar o dia 11 de Março do anno de 1910, dia em que começámos este
trabalho, Lisboa, capital do reino de Portugal, tomada aos m ouros pelo
primeiro rei portuguez D. Affonso Henriques, no anno de 1147, contando
portanto sete seculos e sessenta e tres annos de existencia, é ainda, se
a compararmos com as demais capitaes, do mundo civilisado, uma grande
aldeia que d'essa civilisação mundial, só tem um vago conhecimento pelo
que lhe contam os donos das lojas de modas e chapeus para senhora, que
annualmente vão a Paris e Londres fazer as suas encommendas e escolher
os seus fornecimentos para a proxima estação de inverno.
Seria
um erro grosseiro, chamar-se absolutamente civilisada, a uma capital
europea, simplesmente porque ella possue tracção electrica, um theatro
lyrico, meia duzia de avenidas desgraciosas e mal illuminadas, um
tribunal da Boa Hora, que nem para servir de sentina publica está nos
casos exigidos pela hygiene e decencia precisas, e alguns hoteis
antiquados em locaes improprios a maioria d'elles aproveitando-se da
velha disposição architectonica de quando a cidade foi reedificada
depois do terramoto de 1755, ha seculo e meio!
Chamar-se
franca e positivamente civilisada a esta capital, onde os garotos jogam
a pedra pelas ruas, e os mendigos andrajosos e cobertos de vermes dia e
noite assaltam os transeuntes, estendendo a mão á caridade publica como
se usa nas estradas da Beira; onde no seu centro mais concorrido gira
toda a noite uma legião de prostitutas, bandalhas da mais alta esphera,
trocando entre si phrases obscenas, que chegam aos ouvidos de toda a
gente, e servindo de materia de engorda para os cofres das multas
policiaes; onde a gaitada semi-núa e devassa, risca a carvão as paredes
dos predios, desenhando imagens eroticas e palavras indecentes... [...]
A
vida da cidade é na baixa que circula com mais intensidade, n'esse
acanhado peymetro que vae da rua das Pretas ao Terreiro do Paço, da rua
dos Fanqueiros á praça de Camões. É n'elle que existem os theatros, os
clubs, as lojas de modas, os hoteis, os restaurantes, os cafés, as
tabacarias de luxo, as secretarias de estado, os tribunaes, o correio,
os telegraphos, os templos elegantes, os ateliers de modista, os
consultorios medicos de maior fama, as ourivesarias mais opulentas, as
pastellarias da moda, os grandes magasins, Gran della e Armazens
do Chiado; os dentistas de fama, os cabelleireiros e perfumistas, tudo
emfim quanto chama a concorrencia e intensificação da vida de uma
capital, á excepção dos banhos publicos, que eram as casas de reunião
dos romanos distinctos dos tempos de Nero e Tiberios."
(Excerto do Proemio)
Joaquim Alfredo Gallis (1859-1910). "Mais conhecido por Alfredo Gallis, foi um jornalista e
romancista muito afamado nos anos finais do século XIX, que exerceu o
cargo de escrivão da Corporação dos Pilotos da Barra e o de
administrador do concelho do Barreiro (1901-1905). Usou múltiplos
pseudónimos, entre os quais 'Anthony', 'Rabelais', 'Condessa do Til' e
'Katisako Aragwisa'. Desde muito jovem redigiu artigos e folhetins em
jornais e revistas, entre os quais a Universal, a Illustração Portugueza, o Jornal do Comércio, a Ecos da Avenida e o Diário Popular
(onde usou o pseudónimo Anthony). Como romancista conquistou grande
popularidade, especializando-se em textos impregnados de sensualismo
exaltado que viviam das «fraquezas e aberrações de que eram possuídas,
eram desenvolvidas entre costumes libertinos e explorando o escândalo».
Escreveu cerca de três dezenas de romances, por vezes publicados com o
pseudónimo 'Rabelais'. Alguns dos seus romances têm títulos sugestivos da
sensualidade que exploram, nomeadamente Mulheres perdidas, Sáficas, Mulheres honestas, A amante de Jesus, O marido virgem, As mártires da virgindade, Devassidão de Pompeia e O abortador. É autor dos dois volumes da História de Portugal, apensos à História, de Pinheiro Chagas, referentes ao reinado do rei D. Carlos I de Portugal."
Encadernação meia de pele com ferros gravados a ouro na lombada. Conserva as capas de brochura.
Exemplar em bom estado geral de conservação. Aparado. Capa frontal apresenta pequenas falhas de papel no pé.
Muito invulgar.
45€

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