20 setembro, 2025

GALLIS, Alfredo - A BAIXA.
Lisboa no Seculo XX. (A grande aldeia). Lisboa, Parceria Antonio Maria Pereira : Livraria Editora, 1910. In-8.º (
19x12 cm) de [6], 394, [2] p. ; E.
1.ª edição.
Curioso romance de costumes de cariz erótico. O autor, conhecido pela sua escrita sensual, descreve a baixa de Lisboa em tudo quanto esta pode oferecer de mau e repreensível, atentatória da moral e bons costumes da época, através dos "tipos" que a frequentam e habitam.
Obra invulgar e muito curiosa.
"Ha que explicar ao publico a synthese philosophica e sociologica d'esta obra, antes de entrarmos na sua contextura litteraria propriamente dita.
Ao raiar o dia 11 de Março do anno de 1910, dia em que começámos este trabalho, Lisboa, capital do reino de Portugal, tomada aos m ouros pelo primeiro rei portuguez D. Affonso Henriques, no anno de 1147, contando portanto sete seculos e sessenta e tres annos de existencia, é ainda, se a compararmos com as demais capitaes, do mundo civilisado, uma grande aldeia que d'essa civilisação mundial,  só tem um vago conhecimento pelo que lhe contam os donos das lojas de modas e chapeus para senhora, que annualmente vão a Paris e Londres fazer as suas encommendas e escolher os seus fornecimentos para a proxima estação de inverno.
Seria um erro grosseiro, chamar-se absolutamente civilisada, a uma capital europea, simplesmente porque ella possue tracção electrica, um theatro lyrico, meia duzia de avenidas desgraciosas e mal illuminadas, um tribunal da Boa Hora, que nem para servir de sentina publica está nos casos exigidos pela hygiene e decencia precisas, e alguns hoteis antiquados em locaes improprios a maioria d'elles aproveitando-se da velha disposição architectonica de quando a cidade foi reedificada depois do terramoto de 1755, ha seculo e meio!
Chamar-se franca e positivamente civilisada a esta capital, onde os garotos jogam a pedra pelas ruas, e os mendigos andrajosos e cobertos de vermes dia e noite assaltam os transeuntes, estendendo a mão á caridade publica como se usa nas estradas da Beira; onde no seu centro mais concorrido gira toda a noite uma legião de prostitutas, bandalhas da mais alta esphera, trocando entre si phrases obscenas, que chegam aos ouvidos de toda a gente, e servindo de materia de engorda para os cofres das multas policiaes; onde a gaitada semi-núa e devassa, risca a carvão as paredes dos predios, desenhando imagens eroticas e palavras indecentes... [...]
A vida da cidade é na baixa que circula com mais intensidade, n'esse acanhado peymetro que vae da rua das Pretas ao Terreiro do Paço, da rua dos Fanqueiros á praça de Camões. É n'elle que existem os theatros, os clubs, as lojas de modas, os hoteis, os restaurantes, os cafés, as tabacarias de luxo, as secretarias de estado, os tribunaes, o correio, os telegraphos, os templos elegantes, os ateliers de modista, os consultorios medicos de maior fama, as ourivesarias mais opulentas, as pastellarias da moda, os grandes magasins, Gran della e Armazens do Chiado; os dentistas de fama, os cabelleireiros e perfumistas, tudo emfim quanto chama a concorrencia e intensificação da vida de uma capital, á excepção dos banhos publicos,  que eram as casas de reunião dos romanos distinctos dos tempos de Nero e Tiberios."
(Excerto do Proemio)
Joaquim Alfredo Gallis (1859-1910). "Mais conhecido por Alfredo Gallis, foi um jornalista e romancista muito afamado nos anos finais do século XIX, que exerceu o cargo de escrivão da Corporação dos Pilotos da Barra e o de administrador do concelho do Barreiro (1901-1905). Usou múltiplos pseudónimos, entre os quais 'Anthony', 'Rabelais', 'Condessa do Til' e 'Katisako Aragwisa'. Desde muito jovem redigiu artigos e folhetins em jornais e revistas, entre os quais a Universal, a Illustração Portugueza, o Jornal do Comércio, a Ecos da Avenida e o Diário Popular (onde usou o pseudónimo Anthony). Como romancista conquistou grande popularidade, especializando-se em textos impregnados de sensualismo exaltado que viviam das «fraquezas e aberrações de que eram possuídas, eram desenvolvidas entre costumes libertinos e explorando o escândalo». Escreveu cerca de três dezenas de romances, por vezes publicados com o pseudónimo 'Rabelais'. Alguns dos seus romances têm títulos sugestivos da sensualidade que exploram, nomeadamente Mulheres perdidas, Sáficas, Mulheres honestas, A amante de Jesus, O marido virgem, As mártires da virgindade, Devassidão de Pompeia e O abortador. É autor dos dois volumes da História de Portugal, apensos à História, de Pinheiro Chagas, referentes ao reinado do rei D. Carlos I de Portugal."
Encadernação meia de pele com ferros gravados a ouro na lombada. Conserva as capas de brochura.
Exemplar em bom estado geral de conservação. Aparado. Capa frontal apresenta pequenas falhas de papel no pé.
Muito invulgar.
45€

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