OLIVEIRA, Venceslau de - MARIA CONDESSA (Alma de Fadista) : romance original. Lisboa, Casa Editora Nunes de Carvalho, [192-]. In-8.º (21x14 cm) de 376 p. ; il. ; E. OLIVEIRA, Venceslau de - FADO E AMOR (Alma de Fadista) : romance
original. Lisboa, Casa Editora Nunes de Carvalho, [192-]. In-8.º (21x14
cm) de 309, [5] p. ; il. ; E.
1.ª edição.
Conjunto de dois romances - encadernados num único tomo - cujo tema é o "Fado" e os meandros da "canção nacional", pretexto para o autor abordar os problemas políticos e sociais do país, tendo ambos impresso na capa em sub título "Romance da vida boémia".
Ilustrados com bonitos desenhos no texto e em página inteira.
Obras raras e muito curiosas, com interesse para a bibliografia fadista. De registar a quase inexistência de referências bibliográficas, sendo que a própria BNP não menciona.
"Madrugara-se naquela manhã entrudesca no palácio dos Marqueses do Rosal.
Não era hábito a senhora Marquesa levantar-se tão cedo, mas naquele dia, não se sabia porque razões, tivera uma enorme vontade em o fazer.
Pedia-lhe a sua compleição física, abalada por tanto infortúnio, um passeio matutino pelos áridos campos no intuito de poder mais livremente respirar fundo.
Inocência e Julião, só com a lembrança de se terem visto livros de José, por uns tempos, nem dormiram de contentamento.
Pareciam ter rejuvenescido.
Felismina, solteirona, pouco conhecedora da vida lisboeta, pensava na obtenção de licença para num pedaço da tarde ir à Avenida com Maria Rosa gozar os folguedos carnavalescos que diziam serem divertidos, e só essa idéia a fizera erguer mais cedo.
O certo é, que, as quatro almas que ali viviam como Deus com os anjos, se encontravam à mesma hora no ângulo do jardim a receberam os bons dias do astro-rei que, a brincar, vinha inundar-lhes de luz os enrugados semblantes."
(Excerto de Maria Condessa - I. Um golpe mortal)
"Decaìa a olhos vistos o regime monárquico, dois anos após o audacioso atentado contra a família real em que baquearam, não só o rei D. Carlos de Bragança e seu filho, o príncipe D. Luiz Filipe, como os arrojados regicidas, Buiça e Costa, quando o fado começou a trilhar o caminho da sua mais brilhante auréola.
Em todos os tempos e em tôdas as épocas, nos momentos mais periclitantes da vida portuguesa as canções foram sempre os clamores da revolta mal contida, contra a esmagadora opressão que tiranizava o povo trabalhador, digno de melhor sorte.
Assim, emquanto ilustres caudilhos republicanos apresentavam nos comícios o desmantelar de um trono carcomido, os fadistas, por seu turno, na maioria analfabetos, de guitarra em punho, andavam pelas ruas e tavernas, desinteressadamente, fazendo intensa propaganda de um regime novo, mostrando, em violentas estrofes, as pústulas chaguentas da depauperada monarquia mal governada que tinha por chefe em pusilánime, filho mais novo do rei-morto, a morrer-se ao sabor dos políticos palacianos.
E o povo escutava-os desvanecidamente."
(Excerto de Fado e Amor - I. Fadistas de raça)
Venceslau de Oliveira: Foi diretor do jornal Canção do Sul. Dramaturgo, editor,
jornalista e poeta. Foi o fundador e o diretor do jornal O Estrondo, foi vogal do Grémio
dos Artistas Teatrais. Sublinha-se o seu temperamento revolucionário e crítico, quer no
que respeita ao teatro quer no que respeita ao fado. Poeta e prosador, em 1931 escreve
uma obra sobre o fado, Alma de Fadista. O seu romance pretende dar a conhecer os
prosélitos do fado desde 1900, e pede ajuda aos fadistas para lhe enviarem dados
biográficos e fotografias. Profissionalmente, é impressor numa tipografia. Venceslau de
Oliveira tem muitos filhos, entre eles um Raul Álvaro de Oliveira."
(Fonte: Tuna, Cátia Sofia Ferreira, «Não sei se canto se rezo»: ambivalências culturais e religiosas do fado (1926-1945)
Volume II : Anexos, 2020)
Encadernação em tela revestida de pano com rótulo carmim e dourados na lombada. Conserva as capas de brochura anteriores.
Exemplar em bom estado de conservação.
Raro conjunto.
80€