JOBIM, José - A VERDADE SOBRE SALAZAR. (Entrevistas concedidas em Paris pelo Sr. Affonso Costa, ex-presidente da Liga das Nações e antigo primeiro-ministro de Portugal). Prefacio de Danton Jobim. Rio, Calvino Filho, editor, 1934. In-8.º (19x12,5 cm) de 141, [3] p. ; E. 1.ª edição.
Importante contributo para história da política portuguesa nos alvores do Estado Novo, protagonizado por Afonso Costa - figura de proa da 1.ª República - que através de um conjunto de entrevistas concedidas a partir do exílio a um jornalista brasileiro, dá conta do seu "incómodo" com a situação vigente no país.
"Não sou amigo nem partidario do Sr. Affonso Costa. Reporter brasileiro, correspondente de jornaes brasileiros, não desejo immiscuir-me nos negocios internos de Portugal. Colhi, entretanto, um grande e expressivo depoimento sobre o momento politico portuguez. O ex-primeiro ministro e antigo presidente da Liga das Nações supportou durante annos o assédio que lhe movi. Não queria falar a estrangeiros sobre seu paiz. Ao fim de trez annos, capitulou. O que não obtivera a habilidade do jornalista conseguiu o odio contra a dictadura militar que, atacando-o, lhe nega o direito de defesa. E o Sr. Affonso Costa falou-me, concedendo a sua entrevista mais sensacional. Este livro é uma resposta ao "Salazar" do Sr. Antonio Ferro. Deveria compol-o um portuguez. Mas o estado totalitario do Doutor Salazar, pela sua propria estructura e finalidade, se attribue em Portugal o dominio absoluto dos prélos e das consciencias. Além do mais, a dictadura portugueza mantém um amplo e bem organisado serviço de propaganda entre nós. Creio, pois, que se deve conceder o direito de trazer ao publico brasileiro "a voz do outro sino"."
(Introdução)
"Neste livro o sr. Affonso Costa renova a sua velha crença nos destinos da democracia.
Si eu tivesse de tratar da personalidade politica do ex-primeiro ministro portuguez antes de ter deante dos olhos a série de entrevistas que ahi está, não o chamaria pura e simplesmente um democrata. Democrata e democracia são, em nosso tempo, expressões vagas, imprecisas, e, por isso, incolores, tão amplo o sentido que as conveniencias partidarias lhe emprestaram, sobretudo nas nossas jovens republicas da America Latina, e tão numerosos e evidentes têm sido os contrabandos de idéas e interesses sob esses rotulos honestos.
Recordando o seu passado republicano e as idéas que elle sustentou, teriamos preferido situal-o entre os authenticos jacobinos, cuja caracteristica fundamental é o culto da autoridade soberana do Estado, a necessidade da submissão de todos á lei, que emana da vontade popular, expressa através da igualdade politica, sem que se attenda ás differenciações de ordem economica e social. [...]
O estatismo exagerado que caracteriza a nossa época é levado a suffocar as liberdades individuaes. O sr. Salazar repete as variações do sr. Mussolini sobre as relações entre liberdade e autoridade, que, aliás, em si, não têm nada de novo.
As theorizações fascistas, o esforço pela creação de uma physionomia propria para o fascismo, estão consubstanciadas na exposição doutrinaria redigida pelo Duce para a Encyclopedia Italiana:
"Tudo no Estado, nada contra o Estado, nada fóra do Estado". (Discurso no Scala de Milão). [...]
O sr. Oliveira Salazar é partidario intransigente desse estaismo fascista. Sob a sua immediata direcção organiza-se em Portugal um movimento corporativista, nos moldes do syndicalismo burocratico italiano. Mas haverá consições, na republica portugueza, para a victoria desse movimento? E a dictadura militar qu governa o paiz será capaz dessa tarefa? Eis uma these interessante e opportuna que aos pensadores e homens de estado portuguezes, que conhecem de parto a situação politico-social do paiz, incumbe responder."
(Excerto do Prefacio)
"O Hotel Vernet, situado na rua do mesmo nome, que atravessa os Champs Elysées na altura de Georges V, é um dos mais curiosos de Paris. Ali se hospedam estrangeiros apenas. É um hotel caro e familiar. Ha antigos presidentes e mesmo reis dos paizes mais remotos. [...]
O Sr. Affonso Costa não me faz esperar cinco minutos. Entra com um sorriso nos labios. É um homem baixo, forte, elegante, com os cabellos grisalhos e a pêra - a mais famosa pêra de Portugal - quasi alva. Parece ter apenas quarenta annos. E tem mais de sessenta. Respira saude e energia. E quando fala, ao sorrir faz com que a gente se lembre logo de Mefistopheles, tal a expressão maliciosa, viva, intelligente de sua mascara. Ha mesmo sarcasmo e força nessa mascara.
- "Uma entrevista? diz-me. Pois, seja! Mas quero que note em que condições especiaes e excepcionaes lh'a vou dar. Tenho sempre hesitação e melindre em contar a estrangeiros o que se passa de desagradavel e de injusto no meu paiz. O meu orgulho pessoal e de portuguez não me permitte solicitar apoio ou solidariedade a estranhos e muito menos fazer-lhes queixas."
(Excerto da Entrevista)
José Pinheiro Jobim (Ibitinga, 1909 – Rio de Janeiro, 1979). "Foi um economista e diplomata brasileiro, morto político da ditadura militar brasileira. Trabalhou primeiramente como jornalista, tendo sido revisor e redator de "A Manhã", do Rio de Janeiro, e redator do "Diário de Notícias" de Porto Alegre. Contratado pela Agência Meridional dos Diários Associados, foi redator de "O Jornal" e seu enviado especial à Europa. Entre 1930 e 1936 viajou também à URSS, Ásia e África. Iniciou sua carreira diplomática em 1938, atuando como cônsul de terceira classe, no mesmo ano foi designado vice-cônsul em Yokohama, no Japão. Entre 1938 e 1941, de volta ao Brasil, serviu na Secretaria do Comércio Exterior. Em 1941 foi transferido para Nova Iorque, ainda no posto de vice-cônsul. Promovido a cônsul de segunda classe em 1942, permaneceria em Nova Iorque até 1943 como cônsul adjunto. Desde sua promoção a ministro de primeira classe, em 1959, ocupou o posto de embaixador do Brasil no Equador, de 1959 a 1962, na Colômbia e na Jamaica cumulativamente, de 1965 a 1966, na Argélia, de 1966 a 1968, e no Vaticano e Malta, de 1968 a 1973. Ao se aposentar do Itamaraty, em 1975, estava à frente da representação brasileira no Marrocos, onde chegara em 1973. Fundou com seus filhos a Editora Brasília Rio.
Em 15 de março de 1979, o embaixador, já aposentado, foi à Brasília, onde tomou posse o ditador João Batista Figueiredo e, com ele, o chanceler Ramiro Saraiva Guerreiro, amigo de José Jobim. Durante a cerimônia, Jobim comentou com alguns amigos que estava escrevendo um livro de suas memórias, inclusive detalhes sobre o superfaturamento do governo na construção da Usina Hidrelétrica de Itaipu, que custou dez vezes o valor orçado, totalizando cerca de US$ 30 bilhões. Uma semana depois, no dia 22 de março, Jobim já estava de volta ao Rio de Janeiro e, logo depois do almoço, saiu de sua casa para encontrar um amigo. Seu corpo foi encontrado por um gari dois dias depois do sequestro, a menos de 1 quilômetro da Ponte da Joatinga. Ele estava pendurado pelo pescoço em uma corda de náilon em um galho de uma árvore pequena. Assim como as do jornalista Vladimir Herzog, seus pés, com as pernas curvadas, tocavam o chão, levantando suspeitas sobre a hipótese de suicídio. Seis anos depois, a promotora Telma Musse reconheceu que houve homicídio, mas considerou o caso insolúvel e pediu o arquivamento."
(Fonte: Wikipédia)
Encadernação meia de pele com ferros gravados a ouro na lombada. Conserva as capas originais.
Exemplar em bom estado geral de conservação. Aparado. Com falhas de pele na lombada.
Raro.
Com interesse histórico.
45€