04 maio, 2022

CASTRO, D. João de - MORTE DE HOMEM
. Lisboa, Empreza da Historia de Portugal, Sociedade editora, 1900. In-8.º (20 cm) de VIII, 480 p. ; il. ; E.
1.ª edição.
Segunda obra em prosa do autor, oferecida a um seu antigo companheiro de estudos, actualmente sacerdote numa paróquia não identificada. A história será baseada em episódios passados, do conhecimento de ambos, já que, na dedicatória, nota-se a preocupação do autor com algum melindre e tristeza que possa sobrevir ao seu antigo colega com a publicação do romance.
Livro ilustrado com bonitos desenhos encimando o início de cada capítulo.
"Quando n'um ennevoado dia de outubro se espalhou, em Braga, a noticia do fallecimento do velho conde d'Amieira, a população da cidade, impressionada pela surpreza, afadigou-se na curiosidade de conhecer toda a historia d'aquella morte que fazia desapparecer, para sempre, do seu solo theocratico, essa bella figura mundana que no argot ecclesiastico da terra merecera o cognome de «patriarcha dos janotas». Fôra elle, com effeito, o pdarasto de essa geração de casquilhos que por 1840 levou á Braga sacerdotal as audacias das calças de ganga, ás prégas, e de casaca verde com botões amarellos, que semearam a destruição e o panico amoroso nos corações femininos da epocha. [...]
Esta morte subita e desconsoladora de leão decrepito dera logo ensejo á exhibição dos rancores pessoaes que a sua altiva independencia vira crescer, impassivel, em torno de si; e o conego Miranda, que o odiava, chegou a exclamar, na Arcada, n'um grupo que beberricava café á porta do Vianna:
- Ahi têm, os senhores, o castigo d'aquella vida desregrada: morrer sem sacramentos, como um cão, nos braços dos creados!
O velho janota morreram com effeito, como tinha vivido, só, com o seu antigo creado Marçal, n'aquelle casarão da Amieira, que com a sua humida sombra de convento arruinado, entristecia ainda mais a erma rua arrabaldina em que fôra construido. Solteirão inacessivel, Simão Coutinho atravessará uma lenta existencia de setenta annos, com a jovialidade resistente de quem vê e sente superficialmente as coisas do mundo. Amado na mocidade, conseguira encanecer sempre galanteador e janota, sem resvalar nas irrisões da velhice impertinente. A sua palavra, adextrada nos fogos de bengala das palestras dos salões, ganhara, ao envelhecer, um verniz de ironia justa e gentil, que o fazia adorar pelos moços como um avô benevolente e finorio, - especie de camarada primacial que, por um engano physiologico, encanecera antes d'elles. Copiavam-lhe as maneiras, a elocução vagarosa, até o emperrado rheumatico dos gestos; mas o que nunca conseguiram imitar, foi o sorriso que se entrevia atravez das suas patriarchaes barbas brancas, - sorriso perenne como a cicatiz de uma ferida mortal, e cuja significação indefinivel devia por certo explicar o segredo da sua vida."
(Excerto do Cap. I)
D. João de Vasconcelos Sousa Castro e Melo (1871-1955). "Nasceu em Azurara, [Vila do Conde], na Casa de Sant'Ana, em 6/8/1871 e foi baptisado 13 dias depois na Matriz local.
Ficou na história da literatura portuguesa com o nome de D João de Castro. Tornou-se inicialmente conhecido devido à inovadora obra poética, mas salientou-se no romance psicológico de carácteres e na investigação histórica.
Deixou vasta obra (poesia, romance, teatro, etc.), e colaborou desde 1926 até à sua morte, em 1955, com "O Primeiro de Janeiro".
Faleceu na sua casa de Prado em 20/5/1955."
(Fonte: https://jpcmt.blogs.sapo.pt/tag/d.+jo%C3%A3o+de+castro)
Encadernação editorial inteira de percalina com dourados gravados na pasta anterior e na lombada.
Exemplar em bom estado de conservação. Pasta frontal apresenta cor algo esbatida à cabeça por acção da luz.
Raro.
Indisponível

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