18 maio, 2022

BRINDE AOS SENHORES ASSIGNANTES DO DIARIO DE NOTICIAS EM 1889
. Lisboa, Typographia Universal (Imprensa da Casa Real), 1889. In-8.º (18 cm) de 153, [3] p. ; B.
1.ª edição.
Livrinho da apreciada colecção Brinde do "Diário de Notícias". Composto por 7 pequenas histórias amenas - crónicas mundanas e novelas ficcionadas - da autoria de algumas das mais destacadas personalidades do panorama literário da época.
"Já lá vão cento e vinte annos, e ainda hoje vive na tradição da formosa villa de Almada a fama de umas mulheres, que davam pela alcunha de Espingardeiras, e que figuraram n'um processo celebre, de que tenho presente o summario.
Pelo depoimento das testemunhas, que no summario foram inquiridas, podemos reconstituir um pequeno capitulo, se não edificante, pelo menos muito elucidativo para os que prégam contra contra a desmoralisação dos tempos de agora.
Fraquezas humanas, houve-as sempre, e d'ellas se não isentam os que mais inaccessiveis se julgam ás paixões e ás culpas. Não se estranhe, pois, que na historia das Espingardeiras figurarassem com escandalo varios frades, e frades dos mais graduados. Narremos.
Em 1769, Maria da Paz, uma mulheraça de 35 annos, robusta, bem parecida e foliona, habitava em Almada, com suas sobrinhas - Hilaria, de 18 annos, Theresa, de 20, e Francisca, de 23.
Estas quatro fémeas, conhecidas pela alcunha de Espingardeiras, escandalisavam pelo seu proceder aquella boa e pacifica villa, recebendo em sua casa a toda a hora os tunantes de todos os matizes, e especialmente a fradalhada, que dos conventos de Lisboa se comprazia em passeios  á Outra Banda."
(Excerto de As Espingardeiras)
"Estamos em plena Serra da Estrella; no Poio Negro.
É o coração do sanatorio que o simples esforço particular ali tem improvisado nos ultimos annos. Original scenario! magestoso e triste a um tempo! grande e severo! bello! oppressivo não sei de que melancolia insinuante que nos invade a alma... [...]
No Poio Negro a verdadeira nota de destaque é a já lendaria Casa da Fraga, habitação improvisada, de um curioso agrupamento de poios graniticos, pelo primeiro doente da Serra, o sr. A. Cesar Henriques. Doente - escrevi, referindo-me a um passado de que nem ha vestigio. Se s. ex.ª hoje não vende saúde, não é, de certo, porque lhe não sobra a que tem. Mas não é ella propriedade com que vá mercadejar quem, em dolorosos annos de morbido sobresalto, aprendeu a aquilatar-lhe o valor.
É originalissima esta Casa da Fraga, nos ultimos tempos residencia da familia do sr. Telles de Menezes, outro doente... victorioso. Originalissima mas fundamentalmente mealancolica! Os poios escuros que servem de tectos apertam o coração.
De manhã é uma alegria sair d'ali e subir á Esplanada dos Instrumentos. Avistam-se então os carpinteiros afanosos, concluindo os dois bonitos predios do sr. Cruz, um dos mais importantes industriaes de Manteigas. Aqui já, em absoluto, podemos dizer que ha boa accomodação para quatro familias.
E além, - nota mais alegre de todas - ao lado do elegante Fragão do Corvo, apoiada phantasticamente na orla de um fraga, e como a desafiar, desdenhosa, a furia das travessias, a linda casita-chalet do sr. Telles de Menezes.
Em frente da immensidade, escalvada, essas representações do conforto civilisado acalentam-nos como uma caricia.
Passa-nos então no espirito uma especie de deslumbramento. Mostram-se menos asperas as ravinas; Manteigas, lá em baixo, é menos funebre; o fio sinuoso do Zezere tem lucilações mais intensas; viçam, mais frescas, as féteiras que o Alva sustenta; o abitoiro, o sargaço, os cachos vermelhos nas tramaseiras do Covão do Jorge, como que se embeberam em nova seiva; no viveiro, as futuras arvores parecem menos rachiticas; a propria Cabeça do Preto se nos figura menos hirta; a Carvalheira, distante, apparecce, revestida de um verde cendrado que a luz crua do sol egualou; e até as aguias, esvoaçando serenas, enfileiras, trazem á mente, não a idéa da destruição e da morte, mas uma idéa genial de força, suprema razão de todo o sensivel bem-estar.
É fugitiva miragem que, após uma permanencia como a que fizemos na Serra durante os mezes de agosto e setembro, acaba por nos communicar uma intima impressão dolorosa, funda, pungitiva - a nostalgia do povoado, a saudade da planicie, a grande attracção das creaturas, e das cousas, essa amalgama incomprehensivel que constitue a vida intensa cá de baixo.
É então que, com dobrada melancolia e dobrado interesse, olhamos estes bravos lutadores que, de diversos pontos do reino, é medida que se vão levantando as casas, chegam para aqui passar o inverno.
São agora vinte e tantos. Bem hajam! não só pelo heroico esforço que praticam para conservar a vida, como pelo indirecto beneficio que fazem, cooperando na confirmação de uma theoria scientifica de enorme alcance, destinada talvez á regeneração physica de numerosa parte da sociedade portugueza. Oxalá a coragem cresça a todos na razão em que ha de crescer o sacrificio! 
Porque é, por em quanto, bastante sacrificio, para o corpo e sobretudo para o espirito, passar um inverno na Serra da Estrella."
(Excerto de A 1441 m. de altitude)
Indice:
Revolvendo as cinzas, por Maria Amalia Vaz de Carvalho. | O baptisado de D. Affonso VI, por Zephyrino Brandão. | As Espingardeiras, por Cândido e Figueiredo, | A 14441 metros de altitude, por Caïel. | Um mysterio, por Christovam Ayres. | A avó, por Guiomar Torrezão. | O baluarte de Diu, por Pinheiro Chagas.
Exemplar brochado, por aparar, em bom estado geral de conservação. Capas frágeis com defeitos e pequenas falhas de papel, que se entendem à lombada.
Raro.
Indisponível

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